O Plenário da Senado aprovou, nesta terça (17/12), o PLP 143/2024, que regulamenta a constituição, o funcionamento e a fiscalização das cooperativas de seguro e as operações de proteção patrimonial mutualista. A matéria vai à sanção presidencial. Se aprovada pelo presidente Lula, as cooperativas estarão autorizadas a constituir seguradoras com o mesmo tipo de isenção fiscal dado hoje ao crédito. De autoria do ex-deputado Lucas Vergílio (Solidariedade-GO), estabelece a Superintendência de Seguros Privados (Susep) como reguladora desses mercados.
Este é um tema que sempre preocupou a liderança do mercado de seguros, uma vez que a concorrência no setor passa a ser ainda mais acirrada e vinha sendo citado por Dyogo de Oliveira, presidente da CNseg, a confederação das seguradoras, como um dos assuntos prioritários na agenda da entidade. Um ponto polêmico, porém, foi trecho que permite a criação de cargos na Susep, que foi aprovado no texto final. A base do governo, no entanto, afirmou que o trecho poderá ser vetado.
A ideia é regulamentar e incorporar estas entidades ao sistema formal de seguros. A lei prevê um regime de transição que deve durar até 3 anos, dando um prazo inicial de 6 meses para as entidades regularizarem a situação, começando pelo cadastro na Susep. Em 2022, a FenSeg (Federação Nacional de Seguros Gerais) estimou que havia mais de 600 associações de proteção veicular no Brasil, com cerca de 4,5 milhões de associados. Mas este número avançou muito nos últimos dois anos.
A Susep estima que mais de 5 milhões de automóveis estejam protegidos no País pelas mais de 3 mil associações de proteção veicular (APVs). Estes grupos, que operam à margem da lei, serão trazidos para a regulação do setor após a aprovação de um projeto que traz regras para o funcionamento delas. “Estamos falando em um aumento de mais 5 a 8 milhões de veículos na frota segurada, ou de 25% a 30% no segmento de proteção do automóvel”, disse à Coluna do Estadão o diretor da Susep Carlos Queiroz. De 37 autorizadas, o universo de empresas que atuarão no segmento sairá para “centenas”, de acordo com ele.
As cooperativas e associações precisarão contratar administradores – uma nova figura jurídica criada pela lei e que será supervisionada pela Susep – que são empresas com conhecimento técnico e que terão a responsabilidade de fazer a gestão dos recursos e riscos. Segundo Glaucia Carvalhal, diretora jurídica da CNseg, as administradoras são peças fundamentais para o regime de proteção patrimonialista funcionar, constituídas como SA com finalidade específica.
A associação deverá celebrar, como condição para início e continuidade da operação de proteção patrimonial, contrato de prestação de serviços com Administradora de operações de proteção patrimonial mutualista, no qual deverão ser estabelecidas as particularidades operacionais do grupo e as obrigações da associação contratante, da administradora contratada, e dos participantes do grupo de proteção patrimonial mutualista.
“Este contrato de prestação de serviços deverá obedecer a critérios estabelecidos pelo CNSP, inclusive no que diz respeito aos direitos e obrigações da associação contratante, da administradora contratada e dos participantes do grupo de proteção patrimonial mutualista, sendo que caberá à administradora gerenciar os valores arrecadados dos participantes e proceder ao pagamento das garantias cobertas”, explica Glaucia.
Sobre a administração das operações de proteção patrimonial mutualista, o texto dispõe que esta é privativa de administradora constituída sob a forma de sociedade por ações que tenha por objeto social exclusivo gerir a operação de proteção patrimonial mutualista e que seja previamente autorizada a funcionar pela Susep.
A administradora será responsável pelas seguintes operações, sem prejuízo de outras que vierem a ser estabelecidas pelo CNSP: (i) processamento de adesões ao contrato de participação, bem como de renovações, alterações, repactuações e cancelamentos; (ii) arquivamento de dados cadastrais e de documentação de participantes, beneficiários e, se for o caso, de corretores de seguros, demais intermediários e seus prepostos; (iii) cálculo, cobrança e recolhimento do rateio mutualista de despesas e outros valores; (iv) regulação e liquidação de eventos cobertos; e (v) pagamento de indenizações e adimplemento de outras obrigações relacionadas à garantia de eventos.
Os recursos dos grupos de proteção patrimonial mutualista arrecadados pela administradora, a qualquer tempo, devem ser depositados e aplicados, desde a sua disponibilidade e enquanto não utilizados para as finalidades previstas no contrato de participação por adesão, na forma estabelecida: (i) pelo Conselho Monetário Nacional, quanto aos recursos garantidores de provisões técnicas; e (ii) pelo CNSP, quanto aos demais recursos.
Após a constituição da seguradora, com capital mínimo de cerca de R$ 15 milhões para atuar em seguro de vida no Brasil, a cooperativa poderá buscar financiamento com as seguradoras e resseguradoras do setor, Pelo texto, caberá ao Conselho Nacional de Seguros Privados (CNSP) definir quais danos dos participantes e de terceiros serão cobertos pelas garantias desse tipo de operação, bem como normas para assegurar a solidez e liquidez dessas entidades.
A proposta visa garantir segurança jurídica às pessoas que contratarem seguros, ao definir limites de atuação para essas entidades e penalidades, caso sejam constatadas irregularidades. O tema tem sido nos últimos anos uma das prioridades da Agenda Institucional do Cooperativismo, segundo a Organização das Cooperativas do Brasil (OCB), que trabalhou de forma intensa junto à outras entidades setoriais, além do Ministério da Fazenda e da Susep, para assegurar a construção de um texto que permita a regulação adequada do modelo cooperativista.
“Este é um novo marco legal, que se traduz em grande avanço para o Brasil e que abre novas perspectivas e oportunidades para todo o mercado de seguros no Brasil, notadamente para os consumidores e Corretores de Seguros”, afirma o presidente da Fenacor, Armando Vergilio, que se empenhou na aprovação, tanto na Câmara quanto no Senado, de um texto que atendesse a esses objetivos. Vergilio acrescenta que, com esse projeto, nasce um novo mercado, regulado, com proteção e segurança para todos, notadamente para o consumidor e “com novas e boas oportunidades para os Corretores de Seguros”.
O projeto contou com a relatoria do senador Weverton (MA), que apresentou parecer favorável ao texto construído pelos deputados, com alguns ajustes redacionais pontuais. “A aprovação da proposta representa um marco histórico, pois vai oportunizar que a atuação das cooperativas seja ampliada para os segmentos nos quais há operação de seguradoras constituídas sob forma de sociedade anônima”, explica a OCB em nota. “Essa conquista representa um passo fundamental rumo a um setor de seguros mais acessível e inovador, capaz de atender às necessidades dos brasileiros e contribuir para o crescimento da economia do país”.
Ricardo Balbinot, diretor da Cresol e representante da OCB no grupo de trabalho do setor de cooperativismo do Congresso, participou do desenhou a lei aprovada ontem. Segundo ele, cooperativismo é um modelo de organização econômica que surgiu no século XIX, com o objetivo de promover a cooperação entre os indivíduos para atender necessidades comuns.
Originado na Europa, especificamente na Inglaterra, com o movimento dos Rochdale Pioneers em 1844, o cooperativismo se baseia em princípios fundamentais como a adesão voluntária, o controle democrático, a participação econômica dos membros, a autonomia e independência, a educação, o treinamento e a informação, além do interesse pela comunidade. Esses princípios orientam as cooperativas a operarem em benefício de seus associados, promovendo o desenvolvimento social e econômico.
“Com a regulamentação do seguro de proteção mútua, as cooperativas poderão oferecer produtos que garantem a proteção dos seus associados de maneira mais acessível. Isso significa que pessoas que antes não tinham acesso a seguros tradicionais poderão contar com uma cobertura adequada, promovendo a inclusão financeira”, afirma em nota.
Balbinot acredita que a entrada das cooperativas no mercado de seguros impulsionará a inovação. “Com a concorrência saudável que surge, as cooperativas serão incentivadas a desenvolver produtos mais atrativos e personalizados, que atendam às necessidades específicas de seus associados. Isso não só beneficiará os consumidores, mas também elevará o padrão do setor como um todo.”
O mercado de seguros no Brasil é vasto e possui um grande potencial de crescimento. Com a inclusão das cooperativas, estima-se que haja uma expansão significativa na oferta de produtos de seguro, atraindo novos associados e aumentando a participação das cooperativas no mercado. Isso não só beneficiará as cooperativas individualmente, mas também contribuirá para a saúde econômica do setor de seguros como um todo.
De acordo com a OCB, as cooperativas veem ao encontro de uma das principais prioridades do setor: a educação financeira. “Historicamente, temos um papel educacional nas comunidades. Com a introdução dos seguros, elas poderão promover campanhas de conscientização sobre a importância da proteção financeira e dos seguros, educando seus membros sobre como utilizar esses produtos de forma eficaz.”