O setor de seguro de vida e previdência está profundamente ligado ao tema da longevidade, que caminha ao lado de outros tópicos prioritários, como inteligência artificial, fatores macroeconômicos e questões sociais que buscam reduzir o expressivo gap de proteção financeira da população brasileira. Mas como nos adaptaremos aos desafios de viver uma vida mais longa, saudável e produtiva?
“Precisamos tratar esse tema de forma positiva, pois ele tem sido abordado sob uma ótica muito negativa, com foco na queda do PIB, na crise de saúde e no envelhecimento populacional crescente”, afirmou Andrew Scott, economista renomado e professor da London Business School, durante sua palestra “Você está pronto para a vida de 100 anos?”, realizada na abertura do Fórum Fenaprevi em São Paulo.
Com visão otimista, mas desafiadora, sobre como podemos nos preparar para um mundo onde a longevidade será cada vez mais presente, o economista traz uma reflexão sobre os esforços coletivos, como governo, setor de seguros e indivíduos. “Exige um esforço coletivo de adaptação, inovação e investimento em nosso futuro – desde a juventude até a velhice, e o setor de seguros, com sua vocação para proteção e planejamento, tem um papel fundamental nessa jornada para um futuro mais longevo e produtivo”, afirma.
Scott destacou a importância de enxergar a longevidade como uma questão prioritária e tão urgente quanto a inteligência artificial (IA) e as mudanças climáticas. “É absolutamente uma prioridade individual e coletiva essencial”, enfatizou. “Falamos muito sobre IA e mudanças climáticas e sobre como precisamos nos adaptar ao futuro que essas forças estão moldando. No entanto, ouvimos muito pouco sobre como nos preparar para as prioridades associadas às vidas mais longas que estamos vivendo agora. A longevidade é tão importante quanto essas outras grandes questões globais.”
Ao abordar a adaptação necessária para uma sociedade mais longeva, Scott pontuou que o Brasil tem uma grande oportunidade, desde que invista em políticas públicas que priorizem a educação contínua e a inclusão dos trabalhadores seniores no mercado. Ele destacou que, para viver mais, é necessário produzir por mais tempo, e que isso exige mudanças culturais, institucionais e na mentalidade das pessoas.
“A sociedade está envelhecendo, e isso tem consequências. Precisamos pensar de forma diferente, criar estruturas que apoiem essa transição. Envelhecer não é um problema isolado; é uma transformação radical que afeta tudo, inclusive os seguros e a previdência. Não é apenas uma questão de persuadir as pessoas a poupar, mas de mudar a forma como pensamos e agimos”, afirmou.
Para Scott, viver mais significa investir no futuro em todas as fases da vida. “Se vamos viver mais, como vamos usar nosso tempo? Como vamos equalizar os recursos financeiros, pois precisamos ter lazer por toda a vida e não só na velhice para termos saúde lá na frente. Se vou viver mais, trabalhar mais, posso economizar menos durante a vida. É uma fase de acumulação e desinvestimento, com produtos financeiros que precisam atender essas novas exigências. Temos de investir no nosso futuro muito mais do que qualquer geração anterior”, disse.
Ele explicou que essa nova realidade exige que priorizemos aspectos como saúde, finanças, habilidades, relacionamentos e senso de propósito de se planejar para uma vida longa. quanto vou viver, quanto preciso para a aposentadoria? “A sociedade ainda não estruturou instituições, normas ou políticas para nos ajudar nesse processo. Então, como podemos inovar e assegurar que o envelhecimento tenha menos impacto na nossa saúde física, mental e financeira? Como podemos trabalhar ou estudar de maneira diferente?”, questionou o economista.
Scott também apontou como essa mudança afeta diretamente as gerações mais jovens e de meia-idade. “Hoje, somos diferentes das gerações anteriores. Eu, por exemplo, sou um homem de 59 anos muito diferente do meu pai e do meu avô. Da mesma forma, meus filhos têm comportamentos distintos, não têm casa própria, e isso reflete as mudanças que estão ocorrendo na sociedade.”
Em saúde, ele afirma que é preciso mudar o foco do pensamento “a saúde é cara”. Sim, é. Vamos precisar de mais recursos para financiar esta vida mais longa. Temos de ter prevenção, não intervenção. Inovação na prevenção. Combinar o envelhecimento e saúde. Temos de ser produtivos por mais tempo. Não vai gastar menos dinheiro. Vai gastar o mesmo ou até mais, mas nos manter bem e não para nos tratar quando já estivermos doentes”.
Outro ponto central da palestra foi o impacto da IA, especialmente no mercado de trabalho. Segundo Scott, a tecnologia pode tornar as habilidades humanas ainda mais valiosas. “A IA é extremamente eficiente em habilidades ‘não-humanas’, como algoritmos e big data. Em contrapartida, trabalhadores mais velhos tendem a ter maior inteligência emocional, o que pode se tornar um diferencial ainda mais valorizado”, explicou.
Na área da saúde, a IA também pode redefinir o papel do paciente, que hoje desempenha uma função passiva. “Vou gastar fortunas para não ter demência com comidas e hábitos saudáveis. O propósito da vida é entender quem você é. Isso ajuda a ter saúde mental. Atualmente, os pacientes relatam sintomas e recebem um diagnóstico médico. Com a IA, podemos reivindicar maior autonomia nesse processo. Essa transformação precisa ser parte de uma mudança sistêmica em direção à saúde preventiva, uma vez que apenas 20% é genético e 80% comportamental. Por isso, o que você vai fazer para se tornar evergreen, perene”, concluiu.