Debate organizado pelo TozziniFreire Advogados mostra impactos do PL de seguros no setor

Fred Knapp, vice da Fenaber, ressalta que as incertezas trazidas pelo PL trazem algumas preocupações e podem mudar algumas premissas quanto aos valores que serão pagos em 3 ou 4 anos

Frederico Knapp, vice-presidente da Federação Nacional das Empresas de Resseguros (Fenaber) e CEO da Swiss Re no Brasil, avaliou que caso o texto-base do PL 29 seja aprovado pela Câmara como está pode impactar o setor. Ele explica que, atualmente, a Superintendência de Seguros Privados (Susep) tem uma regra que determina o quanto uma seguradora pode assumir de limite de capacidade para um determinado risco, mas com a mudança do PL, o patrimônio líquido ajustado de todas as companhias não vai conseguir assumir alguns riscos. 

“Tem uma limitação da Susep que é feita justamente para proteger o mercado quando tem um sinistro de grande volume para que não quebre a indústria. A Susep monitora mensalmente isso, porque no nosso dia a dia, temos que certificar se temos liquidez suficiente para cobrir aquelas eventuais obrigações que assumimos”, disse Knapp, em evento promovido pelo TozziniFreire Advogados, na última quinta-feira, 11 de julho de 2024, sobre o PLC nº 29/2017, que dispõe sobre normas de seguro privado, aprovado pelo Senado Federal em 18 de junho de 2024 e que tramita, atualmente, na Câmara dos Deputados sob o nº 2597/2024.

Knapp ressaltou que as incertezas trazidas pelo PL trazem algumas preocupações e podem mudar algumas premissas quanto aos valores que serão pagos em 3 ou 4 anos. “Consequentemente, a gente não sabe o quanto isso pode aumentar, claramente você tem um custo operacional adicionado que vai ter como indústria e alguns riscos que hoje não temos dados suficientes para testar e qual é a jurisprudência de um seguro RC de uma responsabilidade civil que teremos daqui 5 ou 6 anos”, alertou.

Frederico avaliou que a indústria terá um ano de implementação e muito trabalho pela frente em caso de aprovação final do PL. Ele ressaltou que o mercado de seguros é internacional e nenhum outro país tem leis do tamanho da que está sendo criada no Brasil. “Na nossa leitura, ela é uma lei estruturada como se fosse de massificados, mas se for olhar os artigos na íntegra, é uma lei efetivamente feita para grandes riscos.”

O evento reuniu mais de cem pessoas com diversos players do setor de seguros e resseguros, além de risk managers e compradores de grandes riscos. Na abertura, Bárbara Bassani, sócia da área de Seguros e Resseguros do escritório, fez uma apresentação inicial, contemplando os principais pontos do projeto, trazendo uma visão geral das mudanças e alguns possíveis impactos.

Bárbara Bassani afirmou que o Brasil nunca esteve tão perto de ter uma lei de seguros. Segundo ela, “o projeto já passou pelas duas Casas e cabe, agora, à Câmara somente avaliar o Substitutivo aprovado pelo Senado”, informa release divulgado sobre o evento.

Atualmente, o Código Civil tem um capítulo específico destinado ao tratamento do contrato de seguro. Com o Marco Legal de Seguros, esse capítulo seria revogado e o Brasil passaria a ter uma legislação específica de seguros, composta por 134 artigos. Bassani mencionou que o PL não é simplesmente uma atualização do que já existe, pois traz muitas novidades, como é o regramento para regulação de sinistros e mudanças em diversos outros pontos, como, por exemplo, nos marcos dos prazos prescricionais.

“Vai depender, ainda, em diversos aspectos, da regulamentação por parte da SUSEP”. Exemplo disso é o Capítulo de Resseguros, inserido no PL e que pode gerar uma discussão sobre certa incompatibilidade em alguns dos seus dispositivos com a Lei Complementar nº 126/2007, que dispõe sobre o resseguro. “Poderá haver uma discussão sobre qual desses artigos vai prevalecer e como eles irão dialogar”, explicou a sócia do escritório. 

Bárbara seguiu afirmando que, apesar disso, se a lei for publicada e o Brasil passar a ter uma nova legislação, caberá aos operadores do direito e aos players do setor um trabalho contínuo de cumprimento e adaptação da lei, para que seja extraído dela o melhor em suas disposições, evitando retrocessos.

Tatiana Pinheiro, head de Governança da Allianz Trade no Brasil, seguradora focada em seguros de crédito e garantia, mencionou alguns pontos de atenção do PL. O primeiro deles é o fato de não ter tratamento diferenciado entre grandes riscos e seguros massificados. “O próprio regulador, no final de 2020 e início de 2021, reconheceu a necessidade de tratamento diferenciado entre esses dois tipos de produtos”, o que foi bastante positivo para seguros de crédito, afirmou Pinheiro.

Outro ponto citado por Pinheiro é a falta de paridade presente no texto do PL, que diz que as questões serão decididas em favor do segurado, caso haja alguma divergência entre o que está escrito e a sua aplicação. Isso significa que o PL não vai entrar no mérito de qual foi a intenção celebrada entre seguradora e segurado. “Hoje, partimos de um cenário em que há uma liberdade na nossa negociação. Eventualmente, com a aprovação desse projeto, podemos ter clausulados mais engessados e cláusulas que, às vezes, não vão fazer sentido para o segurado.”

Pinheiro destacou ainda que, no momento do sinistro, a seguradora só vai poder pedir complementação de documentos por uma ou duas vezes, o que pode levar o segurado a apresentar uma grande quantidade de documentos na abertura do sinistro. Ela destacou que “no decorrer da regulação, a seguradora de primeira mão já poderia se resguardar e pedir uma série de documentos que possa precisar”.

O excesso de regramento pode, na prática, fazer com que as seguradoras tenham que passar um contrato por várias áreas e especialistas para entender se uma mudança em um item pode impactar em outro, o que, na avaliação de Pinheiro, pode resultar em custo operacional na operação.

Rafael Amadiu, head global de Seguros da Vale, afirmou que momentos como esse de aprovação do PL, trazem a responsabilidade de fazer um acompanhamento sobre os impactos da nova legislação à luz dos riscos e como pode passar a trabalhar com as novas alterações. “[O PL nº 2597/2024] tem um tempo maior de adaptação que talvez traga maior conforto para o gestor de risco e, por confiar na adaptabilidade do mercado, poderemos dar continuidade aos nossos negócios, mas eu não consigo não me preocupar com os possíveis impactos, disse Amadiu.

Amadiu destacou que a questão da lei se aplica não apenas ao Brasil, mas a todo o mercado internacional de seguros. Ele admitiu a sua preocupação em como o mercado vai se adaptar e quais os possíveis impactos na questão de custos e questão do prazo de regulação – o PL em tramitação no Congresso determina 120 dias. “Dentro da minha experiência, eu não me lembro de uma regulação que tenha sido concluída em 120 dias. Então, sinceramente, também tenho dúvidas de como a gente vai seguir com isso para o volume de documentos que será solicitado.”

Marcia Ribeiro, assessora técnica do Conselho e da Diretoria da ABGR (Associação Brasileira de Gerência de Riscos), comentou que, após ouvir todas as considerações, tudo indica que as novas regras poderão impactar profundamente o mercado de seguros e fez vários questionamentos sobre as mudanças, entre elas, se todos, a cadeia produtiva, inclusive a SUSEP e a cadeia consumidora estão preparados operacionalmente para a mudança, se haverá arbitragem quando houver impasses e como tudo isso vai impactar na experiência do cliente.

Observou pontos de atenção na fala dos painelistas, alguns relacionados aos princípios do resseguro e, entre eles: aceitação tácita; regulação de sinistros; prescrição; conflitos de normas; e judicialização. E outros como: tratamento igualitário para grandes riscos e massificados; resolução de litígios; relevância e atenção maior ao extenso clausulado; e aumento do custo operacional. “O Brasil está desenvolvendo e temos muitos avanços, mas também temos muito a aprender com o mercado externo que tem grande maturidade”, ressaltou.

Em sendo aprovada, será necessária a adaptação à Lei, com a formação de novas teses jurídicas para o Marco Legal de Seguros e de jurisprudência, além da publicação de novas regras infralegais para sua compatibilização.

Denise Bueno
Denise Buenohttp://www.sonhoseguro.com.br/
Denise Bueno sempre atuou na área de jornalismo econômico. Desde agosto de 2008 atua como jornalista freelancer, escrevendo matérias sobre finanças para cadernos especiais produzidos pelo jornal Valor Econômico, bem como para revistas como Época, Veja, Você S/A, Valor Financeiro, Valor 1000, Fiesp, ACSP, Revista de Seguros (CNSeg) entre outras publicações. É colunista do InfoMoney e do SindSeg-SP. Foi articulista da Revista Apólice. Escreveu artigos diariamente sobre seguros, resseguros, previdência e capitalização entre 1992 até agosto de 2008 para o jornal econômico Gazeta Mercantil. Recebeu, por 12 vezes, o prêmio de melhor jornalista de seguro em concursos diversos do setor e da grande mídia.

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