Seguradoras têm grande oportunidade de crescer de forma sustentável, diz Giannetti da Fonseca

O assunto principal do 7o. Fórum Internacional de Seguros para Jornalistas da Allianz sempre foi sustentabilidade. Por uma questão óbvia. O setor oferece produtos para que governos, empresas e indivíduos mantenham projetos mesmo com a ocorrência de acidentes. Mesmo aqueles catastróficos. Como sempre, plugada nas necessidades dos profissionais de mídia, a Allianz decidiu abordar outros temas de interesse, por achar que sustentabilidade é importante, porém os jornalistas receberam uma dose elevada de informações neste ano. “Em virturde do tema ter sido muito debatido, com o evento Rio +20, assinatura dos Princípios de Sustentabilidade em Seguros, optamos por pensar em outros temas de interesse dos jornalistas, como o impacto da crise financeira no Brasil e o avanço do risco de hackers com o crescimento das mídias digitais”, disse Felipe Gomes, diretor de gestão de mercado estratégico da Allianz.

Eduardo Giannetti da Fonseca abordou “As perspectivas da zona do Euro para 2013, seus impactos na economia global e desaceleração do crescimento dos Brics”. Para o economista, o Brasil conseguiu driblar a crise mundial que se arrasta há quatro anos. Começou como uma crise financeira nos Estados Unidos e hoje é uma crise geral e internacional. Em 2012, o Brasil sente os efeitos da crise, como mostra a projeção do PIB de apenas 1,5% para 2012. Já o mercado de seguros avança na casa dos 20% até julho.

A explicação de Eduardo Giannetti da Fonseca para isso é simples. Enquanto o setor mais machucado pela crise no Brasil foi o industrial, como conseqüência da apreciação cambial e baixa competitividade, o mercado de seguros avança pois vem investindo em tecnologia para atender a nova classe média, que representa mais da metade da população do Brasil. No entanto, é preciso matar um leão por dia para manter a rota de crescimento. “Brasil e seguradoras precisam vencer desafios e aproveitar a grande oportunidade de estarem bem posicionados em um momento em que países de ponta sofrem com recessão, desemprego, ajustes fiscais e também políticos”, cita o economista.

Para Giannetti, a experiência das economias maduras mostra que o padrão de gasto das famílias tende a mudar com o aumento da renda da população. Menos consumo imediato e mais em qualidade de vida, privilegiando os setores ligados a educação e a saúde. No entanto, como crescer com sustentabilidade, evitando os riscos de tantas perdas como as observadas nos últimos quatro anos de crise? “Esta não é uma crise normal. Estamos completando quatro anos de um crescimento muito abaixo da média histórica mundial e isso se deve ao que chamo de hipertrofia financeira causada pela junção de quatro elementos”, diz o economista.

O primeiro elemento foi a prática de juros baixos por um longo período, com crescimento do PIB aliado a baixa inflação, comportamento que deixa o responsável pela política monetária sem qualquer razão para aumentar a taxa de juros. O segundo elemento foi a forte expansão da economia global, em desequilíbrio, com países cronicamente deficitários em conta corrente. O terceiro elemento foi uma aposta de desregulamentação desastrada do mercado financeiro, coisa que o presidente do FED, banco central dos Estados Unidos, reconheceu como um verdadeiro desastre em sua gestão. E, por último, o crescimento das mídias digitais, que potencializaram todos os outros citados.

“Esses elementos trouxeram descolamento da realidade financeira daquela realmente vivida na economia real”, explica. O total de ativos financeiros do mundo, considerando-se os depósitos em bancos, títulos de dívidas e valor de ações no mercado de capital, era de US$ 96 trilhões em 2002. Seis anos depois, US$ 167 trilhões. “Um período incrível, que mostra que a economia real não tinha contrapartida na economia financeira”.

Segundo ele, a melhor metáfora para definir tal cenário foi a do filósofo árabe Avicena, no qual uma pessoa caminha por uma tábua estreita sem dificuldade quando acredita que está apoiada no solo. Quando a pessoa acredita que está num abismo, perde o equilíbrio e cai”, diz. Ou seja, quando mudou a percepção de risco, de que os valores dos ativos não tinham a solidez que se imaginava, mudou a percepção de risco e o mercado financeiro desabou. O que tivemos foi basicamente uma mudança de percepção, percebendo que os ativos financeiros estavam desconectados da vida real.

A diferença para a crise de 1929 foi que nesta os governos decidiram ajudar. “Em 29, os governos não socorreram os mercados e isso gerou uma crise que perdurou 10 anos, com significativa queda do PIB mundial e índice de desemprego na casa de 25%”, comenta. Já nesta crise, os governos socorreram as instituições, socializando as perdas da multiplicação do excesso dos ativos financeiros. Tal socorro não solucionou, só empurrou para frente o momento de uma tomada de decisão mais radical, gerando o que temos hoje. “Um movimento de stop and go da economia mundial, com altos e baixos”.

Atualmente, o foco está na zona do euro, com a Alemanha numa posição super ortodoxa para que os países da comunidade européia avançem na regulamentação bancária e na reforma fiscal. Grécia numa tentativa de deixar a zona do euro sem tantos danos ao acordo e Espanha aceitar compromissos que vão implicar em perda de soberania. “Um sinal positivo é o anúncio do BCE (banco central europeu) de resgatar os países, o que tranqüiliza de certa forma os mercados e reduz os spreads”. Temos também um risco político, que vem das eleições nos EUA. O Congresso Americano tem de aprovar corte de impostos e gastos públicos.

A novidade em 2012 foi os países emergentes, que vinham descolados da crise e passaram a apresentar desaceleração econômica. Na China ainda temos outro problema, que é a confiabilidade dos dados apresentados. O avanço do consumo que eles divulgam não equivale ao baixo consumo de eletricidade. “Não há clareza do que pode acontecer pela falta de confiança no que é divulgado pelo governo”.

Já o Brasil, desde 90, mostra avanço. “Bastava uma pequena piora do cenário externo para que o país ficasse a deriva ou em uma situação de emergência”. No entanto, desta vez, a economia assimilou os ventos ruins. Giannetti cita que o BC pode reduzir a taxa de juros, deixar ocorrer uma pequena desvalorização cambial, rapidamente revertida, com forte valorização do real e agora uma situação menos danosa. Também ajudou o Brasil ter registrado recessão mais tardia, em 2009, e ter saído dela mais rápido do que os outros. “Em 2010 tivemos crescimento excessivo do PIB, de 7,5%, e em nenhum momento se duvidou que o governo não honraria suas dividas”.

O que mudou? A virada das contas externas, enfatiza o economista. Nos anos de ouro, com preço das commodities em alta, o Brasil acumulou reservas, equilibrando a balança comercial e possibilitando o pagamento de dívidas. Isso tornou o pais menos dependente do financiamento externo, o que foi vital para passar pelo pior momento da crise, quando as torneiras de recursos se fecharam completamente.

Outro fator decisivo para ajudar o Brasil foi o dinamismo do mercado doméstico. “O Brasil foi beneficiado pela mobilidade social com o surgimento da nova classe média. Mais de 30 milhões de brasileiros mudaram de classe, o que significou aumento de renda. “Costumamos dizer que a renda da classe C cresceu a taxas asiáticas, enquanto a renda dos ricos avançaram a um ritmo europeu”, compara.

Outro fato relevante para o economista foi a suave transição entre os governos de FHC e Lula. “Era um risco enorme de descontinuidade na condução da política econômica e o Brasil fez isso de forma serena”, ressalta Giannetti. “Claro que o governo Lula precisou abrir o barril de chope de vez em quando para conseguir fazer tudo o que era necessário, mas isso faz parte”. O que não pode, diz Giannetti, é fazer como a Argentina, que se animou e quando acabou o chope abriu o barril de pinga. A festa ficou mais animada, mas a ressaca é brava. Nem mesmo importantes formadores de opinião divulgam mais o índice de inflação da Argentina por não confiarem no indicador após as mudanças da base de cálculos promovida pela governo”, relembra.

O fato é que o Brasil vem crescendo menos, o que mostrou que o Brasil não é uma ilha de prosperidade num mar turbulento. O crescimento previsto para 2012 é desapontador, com algo próximo de 1,5% ao ano. Tal ressaca foi causada pelo superaquecimento da economia, com descontrole inflacionário. O BC adotou uma série de medidas no final de 2010. A economia vinha se equilibrando, mas a crise europeia se agravou. Isso levou a uma redução do PIB num patamar não esperado, com queda da demanda por produtos brasileiros e uma desaceleração expressiva dos investimentos das empresas locais.

Diante desse quadro, o governo Dilma vem adotando medidas de estímulos. No começo, medidas tímidas e esquisitas, como liberar compulsório bancário para compra de automóvel. Isso não estimulou o consumo e não atacou o problema de baixa competitividade e alto custo da indústria local, em dólar. Mas agora parece que o governo resolveu atacar o problema e com isso acredita-se que o Brasil está em aceleração econômica e deve prosseguir ao longo do semestre. Segundo ele, se tudo correr bem e o mundo não atrapalhar, o Brasil retoma o crescimento para taxas entre 3,5% a 4% a partir de 2013.

Uma preocupação é com a dosagem dos estímulos fiscais e econômicos. “Essa é a grande incógnita: será que os estímulos vão conduzir para uma situação em que o Brasil tenta dar um passo maior do que a perna? E isso depende da atuação do governo Dilma. Se ela vai respeitar a autonomia do Banco Central ou se vai tirar o barril de chope de uma festa que começa a ficar boa. Vamos aguardar”.

No que diz respeito ao mercado financeiro, incluindo a indústria de seguros, Giannetti afirma que todos terão de se adaptar a uma nova realidade. O mercado financeiro é avesso à regulamentação. “Os banqueiros têm criatividade diabólica. Querem multiplicar ativos pela especulação”, disse. Ele explica que os bancos cumprem papel essencial de intermediar a poupança privada para transferir aos empreendedores, para que eles possam gerar emprego e riqueza e assim transformar os valores em bom retorno aos investidores. “Mas essa função se desvirtuou e é difícil regulamentar”.

Embora o mercado financeiro brasileiro não tenha incorrido nos erros cometidos pelos pares americanos e europeus, o setor ficou mal acostumado, com altos retornos, liquidez total e risco zero. A regra do jogo mudou e todos vão ter de aprender a duras penas. E isso inclui as seguradoras, que apesar de apresentarem crescimento nas vendas, a rentabilidade recua. “O impacto da queda de juros é brutal. As companhias têm de se adaptar rapidamente a esse novo cenário, com redução de custos e melhoria na subscrição de riscos para poder crescer e ser rentável”, comentou José Garcia, CFO da Allianz Brasil.

Giannetti concorda com Garcia. “Taxas de juros de dois dígitos não voltam mais. Mesmo que o governo seja impelido a aumentar a Selic, não vamos retornar ao patamar de dois dígitos. Isso vai levar ao reposicionamento do poupador e do empresário. Toda a intermediação vai passar por aprendizado de juros baixos. Esse é o nome do jogo atualmente”, afirma.

Para ele, o mercado segurador tem uma oportunidade incrível nas mãos e precisa ser criativo para lançar produtos para a nova classe média. “Temos ai uma grande demanda por produtos de saúde. É importante o governo perceber como tem restringido a oferta de seguro familiar. A população tem acesso a seguro saúde apenas pela empresa e não por meio de contratos individuais. O governo brasileiro tem visão restritiva. Tem de prevalecer liberdade contratual para atender a demanda da população. Claro que o governo precisa ter controle, mas não ao ponto de inibir a atuação das empresas”.

Mercado de seguros imune à crise

Felipe Gomes destacou que embora ainda esteja muito concentrado nas regiões Sudeste, com 66,7% de participação, e Sul, com 15,3%, a velocidade de crescimento das economias locais em várias partes do país anima o mercado segurador. “O crescimento do consumo e as ações de governos em toda a região Nordeste, como o que temos visto o porto de Suape, em Pernambuco, estão trazendo grandes benefícios para o mercado de seguros”, enfatizou Felipe Gomes. Dados da consultoria Siscorp apontam que de janeiro a junho, exceto saúde, enquanto setor cresceu 21% no Sudeste, a expansão chegou a impressionantes 38% no Nordeste.

Na região Centro-Oeste, cujo avanço foi de 18% no mesmo período, as perspectivas repousam na forte expansão do mercado agrícola. “A nova política de subvenções do governo no campo vão permitir que o mercado segurador triplique até 2015”, afirmou Gomes. O Norte do país, que ocupa ainda 1,1% da indústria nacional de seguros e cresceu 16% de janeiro a junho, também projeta uma forte expansão, provocada pelo aumento da renda da população, o avanço dos mercados agrícola e de mineração e as obras de infraestrutura, como a construção de grandes usinas hidrelétricas.

Apesar do crescimento mais acelerado na massa de seguros de vida e automóveis, as grandes obras de infraestrutura em curso no Brasil abrem novas perspectivas para o setor segurador. A construção de rodovias, portos, ampliação de aeroportos, centrais elétricas e projetos associados à Copa do Mundo de 2014 e às Olimpíadas no Rio de Janeiro de 2016 reforçarão a carteira de grandes riscos das seguradoras. De acordo com José Garcia, esse cenário é não só favorável, como também lança uma série de desafios positivos para as empresas e ganho de eficiência. “Cada vez mais, as seguradoras terão de melhorar sua capacidade de análise de risco, aproximando o Brasil dos mercados mais avançados nessa área”, destacou Garcia.

Denise Bueno
Denise Buenohttp://www.sonhoseguro.com.br/
Denise Bueno sempre atuou na área de jornalismo econômico. Desde agosto de 2008 atua como jornalista freelancer, escrevendo matérias sobre finanças para cadernos especiais produzidos pelo jornal Valor Econômico, bem como para revistas como Época, Veja, Você S/A, Valor Financeiro, Valor 1000, Fiesp, ACSP, Revista de Seguros (CNSeg) entre outras publicações. É colunista do InfoMoney e do SindSeg-SP. Foi articulista da Revista Apólice. Escreveu artigos diariamente sobre seguros, resseguros, previdência e capitalização entre 1992 até agosto de 2008 para o jornal econômico Gazeta Mercantil. Recebeu, por 12 vezes, o prêmio de melhor jornalista de seguro em concursos diversos do setor e da grande mídia.

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