As seguradoras especializadas em grandes riscos se reinventam com a falta de investimentos em projetos de infraestrutura desde 2014, ápice das investigações da Lava Jato, que paralisaram novos projetos e muitos dos que estavam em andamento, desencadeando uma drástica redução de negócios para essas seguradoras. A saída foi diversificar a atuação, como fez a subsidiária local da canadense Fairfax. “Neste primeiro trimestre de 2021 crescemos 60% comparado ao mesmo período de 2020”, comemora o CEO Bruno Camargo, em entrevista ao blog Sonho Seguro.
Em 2009, a Fairfax decidiu começar do zero no Brasil. Depois de estudar aquisições locais, o grupo achou um grupo de executivos regressos do Itaú que havia tomado a decisão de não atuar mais em grandes riscos. “Jaques Bergman que liderava grandes riscos no Itaú e eu apostamos em montar a start-up e temos muito orgulho do que construímos”, comenta Bruno Camargo, que assumiu o comando da Fairfax no Brasil em 2016. Bergman hoje é consultor da seguradora.
A companhia diversifica sua atuação aos poucos. A estratégia vai além de entrar em outros ramos, como agronegócios e afinidades, com a parceria estratégica com empresas que agregam serviços essenciais como com a Farmers Edge. Em 2020, a Fairfax concluiu a implementação de 150 estações meteorológicas no campo em parceria com a Farmers Edge. A iniciativa permite que a seguradora tenha acesso aos dados coletados por um total de 600 estações meteorológicas espalhadas pelo Brasil. Essas estações estão instaladas em áreas de cooperativas parceiras da Fairfax, entrepostos de recebimento de grãos, fazendas experimentais e em áreas de agricultores clientes da seguradora.
“Estamos mudando a forma de trabalhar. Acreditamos que podemos mudar a percepção que os consumidores têm de seguro. Queremos prestar um serviço que traga aos clientes a certeza de que fizeram um bom negocio ao comprar uma apólice que os protege e os ajuda nos momentos mais difíceis”, conta Bruno, que nos últimos três anos virou adepto da meditação e do esporte para manter o equilíbrio diante do desafio de empreender no Brasil. “Temos uma estrutura de Recursos Humanos na seguradora que inclui profissionais de diversas áreas para ajudar as pessoas desenvolverem diversos aspectos da vida, do pessoal até o cientifico”, conta.
Ao conscientizar a equipe sobre uma novo jeito corporativo, os projetos começam a dar frutos. O grupo tomou a decisão, mundial, de doar 2% do ganho para projetos comunitários onde tem presença. No Brasil, por exemplo, as doações vão desde ambulâncias para pequenas cidades com forte presença na venda do seguro agro a aulas de inglês e de tecnologia para cooperativas e produtores lidarem com o desafio da sucessão do negócio com os filhos buscando desafio nas cidades grandes. “Com a tecnologia já presente no campo, os produtores precisam aprender a lidar com as várias novidades em equipamentos. Neste período de pandemia, muitas vistorias para aceitação do seguro ou pagamento de indenizações foram feitas pelo próprio cliente, com o envio de imagens e dados”, conta.
É trabalhoso mudar o mindset, mas vale a pena, afirma o CEO da seguradora que já pertence ao grupo das 20 maiores do Brasil. Apesar da crise social e econômica provocada pela Covid-19, a Fairfax Brasil atingiu receita de prêmios de seguro emitidos líquidos no valor de R$ 1,22 bilhão em 2020, o que representou crescimento da ordem de 50% em comparação com 2019, que registrou produção de R$ 818 milhões. No ano passado, o total das provisões técnicas da companhia foi de R$ 2,15 bilhões, enquanto o patrimônio líquido totalizou R$ 401,8 milhões. O total de ativos alcançou R$ 3,4 bilhões contra 2,4 bilhões no exercício anterior.
Segundo ele, em março do ano passado foi tomada a decisão de garantir aos colaboradores a manutenção de seus cargos e posições com um comunicado global afirmando que nenhum colaborador seria desligado por conta da pandemia e foi imediatamente instalado um comitê de crise com calls diários analisando a situação do momento e tomando as devidas ações necessárias. “Com o ambiente de segurança e autonomia, melhoramos a comunicação, revisitamos estratégias e o que parecia crise tornou-se oportunidade”, comemora Camargo.
A maioria das linhas de negócios registrou alta. No segmento de seguros de danos e responsabilidades, ou Property&Casualty (P&C), a seguradora registrou vendas de R$ 509 milhões em 2020, alta de 82% em comparação com 2019. Agronegócio superou R$ 271 milhões, avanço de 113%. Linhas financeiras registrou vendas de R$ 293 milhões.
Outros segmentos, como o de Transportes (R$ 122,6 milhões), registraram crescimento limitado em decorrência da baixa atividade econômica. Mesmo assim, mantiveram volume de produção equivalente ao ano anterior com melhora nos resultados. Além do aumento em volume de prêmios recorde, a sinistralidade também foi controlada e a seguradora fechou 2020 com lucro líquido de R$ 48 milhões contra R$ 75 milhões de 2019. Esse resultado foi impactado pela marcação a mercado da carteira de investimentos, consequência da queda prejudicada pela redução das taxas de juros e a forte oscilação do mercado de capitais no ano passado. “Obtivemos um incremento no resultado técnico de seguros, com índice combinado de 95%. Mesmo com o cenário econômico causado pela pandemia terminamos o ano com o retorno sob o capital de 12%”, diz Camargo.
A Fairfax também tem usado a tecnologia e os investimentos na captação de dados via satélite e análise das informações para uso de toda a cadeia do agronegócios, desde qual o melhor momento de plantio até o preço da soja para a exportação por meio de derivativos. “Os dados dos satélites agregam valor à toda a cadeia”, diz ele, que fechou uma parceria com o Itaú e negocia com a XP para se ter um processo menos oneroso com a mitigação de riscos que a inteligência de dados permite. “Nosso objetivo é usar as informações para melhorar o processo para todos os participantes da cadeia. O produtor tem um custo menor, o seguro mitiga o risco, as cooperativas conseguem mais negócios e até o mercado de derivativos de soja, por exemplo, ganha com este modelo mais preditivo do clima”, enfatiza.
Para 2021, o executivo espera obter o mesmo índice de crescimento com investimentos em tecnologia e também ao ofertar produtos inovadores diante da liberdade dada pela Superintendência de Seguros Privados (Susep) com as novas regras para seguros de danos e de grandes riscos. “Nosso esforço é ir além, impulsionados pela nova plataforma digital prevista para estar a todo vapor no segundo semestre deste ano”, afirma. Já em teste piloto, o novo canal de vendas vai explorar todos os produtos das linhas de negócios para atender os corretores com este conceito de evolução.