DPVAT no alvo do debate sobre ser repaginado ou excluído

A discussão sobre o seguro obrigatório DPVAT está no auge. Muitas são as críticas, concentradas na denúncia e fraudes e uso incorreto do dinheiro. Há também muitos elogios, como ajudar pessoas que nunca pagaram o seguro a receber indenização por danos causados por um acidente de carro. Particularmente, eu acredito em seguros sociais e já conheci muitas pessoas carentes, como viúvas com filhos que tiveram uma chance de recomeçar a vida com apenas R$ 13,5 mil recebidos pela morte de um mantenedor da família em um acidente de carro.

Em editorial publicado nesta segunda-feira, o Estadão afirma que em seu segundo ano, o Governo Bolsonaro se mostra perdido. Cita várias ações, entre elas a medida, absolutamente pontual e sem nenhuma conexão com as prioridades do País, foi a extinção do DPVAT, decretada por meio da Medida Provisória (MP) 904/19. O seguro oferece coberturas para danos por morte e invalidez permanente, bem como reembolso de despesas médicas e hospitalares, em razão de acidentes de trânsito.

A Susep quer eliminar a trava legal que impede zerar o valor da proteção obrigatória para carros e motos, o que pode anular a cobrança por até cinco anos, traz a Folha. Para o órgão, as empresas cobraram mais do que deviam no passado e o dinheiro é do consumidor. O montante, porém, pode ser maior. A Susep apura se a Líder fez despesas administrativas não autorizadas nos últimos dez anos, que acabaram embutidas no valor cobrado dos consumidores. A entidade calcula que as empresas podem ter que devolver mais R$ 1 bilhão, informa a Folha. “Empresas que compõem o consórcio contestam –na sua visão, o dinheiro é privado, resultado de serviço prestado. A pendenga pode parar na Justiça”. 

Também acho que ser obrigatório é um fato importante em algumas situações, pois de livre e espontânea vontade muitas pessoas não fazem seguro. Minha filha, que mora na Alemanha, outro dia retrucou quando eu comentei que a Alemanha era um dos maiores países do mundo em venda de seguro: “Claro que é. Somos obrigados a fazer um monte de seguro sem a gente querer”, disse a jovem de 18 anos. No entanto, o que ela mais admira na Alemanha é que todos tem um vida razoável, ao contrário do Brasil onde a desigualdade está cada dia maior, com poucos ricos e milhares de pobres. Tão carentes que sequer condições de um tratamento médico tem acesso.

Por essas e outras, acredito que deve realmente haver uma grande discussão sobre os seguros sociais, como tem proposto a titular da Susep, Solange Vieira. Mas tudo tem de ser bem discutido. Olhar o que é feito em outros países é um aprendizado e tanto. E pelo que sei, a própria seguradora Líder, que administra o DPVAT, tem feito isso e implementado boa parte das sugestões feitas pelo trabalho de uma consultoria realizado em 2017/2018.

No domingo, a Folha trouxe outro estudo. Auditoria nas contas da Seguradora Líder, feita pela KPMG, questionou uma série de procedimentos na gestão da empresa, incluindo pagamentos por prestação de serviços para pessoas próximas a políticos, a integrantes do governo federal ou ligadas a ministros do STF, muitas vezes sem os devidos detalhamentos e controles. O documento, com cerca de mil páginas, foi obtido pela reportagem da Folha de S.Paulo.

Parte dele avalia o envolvimento da Líder com o que a KPMG chama de “pessoas politicamente expostas”. A Seguradora Líder, em nota, destacou que, após receber o relatório, seguiu as recomendações da KPMG: “Foram adotadas todas a medidas administrativas e de compliance cabíveis, alinhadas com os valores de retidão e transparência que norteiam a Administração da Seguradora Líder”.

Um dos citados foi Luís Roberto Barroso, ministro do STF, que enviou a seguinte nota à Folha: “Senhor editor: A propósito da matéria sobre DPVAT, no que diz respeito a mim, as informações divulgadas acerca do relatório de auditoria não fazem qualquer sentido. Narrados de forma linear e simples, os fatos são os seguintes: entre 2009 e 2013, ao tempo em que eu era advogado privado —E NÃO PESSOA POLITICAMENTE EXPOSTA— dei pareceres e representei a Seguradora Líder em duas ações no STF. Em 2013, fui nomeado para o Tribunal, me afastei inteiramente do escritório e meus antigos sócios tocaram as duas ações no Supremo. Como ministro, jamais votei nas questões envolvendo DPVAT. Difícil entender onde possam ter visto alguma coisa errada.” 

Já a revista IstoÉ traz entrevista com Luciano Bivar. Ele cita que o Ministério da Economia está muito financista. “O governo tem que se desprender de ficar só em uma conta aritmética. Veja essa questão agora do DPVAT. Você não pode seguir com as seguradoras há oito anos indenizando o mesmo valor a uma pessoa que é atropelada. Isso diminui mais ainda a capacidade da continuidade da vida econômica – é um sentido muito pequeno, muito financista. Nos Estados Unidos, acontece o oposto. O IPVA é muito menor que o prêmio de seguros. A indenização vai a US$ 1 milhão. É importante que, se alguém for atropelado na rua, não cesse a sua atividade econômica.”

Jair Bolsonaro também tem se manifestado nas redes sociais. No dia 9, o presidente parabenizou durante transmissão semanal ao vivo o presidente do Supremo Tribunal Federal, o ministro Dias Toffoli, e o chefe da Advocacia-Geral da União (AGU), André Mendonça, pela retomada da redução do valor pago pelo seguro obrigatório DPVAT. “O seguro em si tem bilhões guardado. Não precisa ter um valor tão alto”, afirmou Bolsonaro. “Não vai ter mais festa no DPVAT. Vira e mexe é comum a gente ver questão de fraude nesse tal de DPVAT”.

Neste domingo, o deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), um dos filhos do presidente, também atacou o senador. “Apesar do senador Randolfe Rodrigues, o Brasil segue adiante no tema DPVAT. Vale lembrar que, pelo presidente Jair Bolsonaro, o DPVAT seria de R$ o”, escreveu o deputado na legenda de um vídeo em que um homem comenta a redução no valor do seguro sob o governo Bolsonaro.

O colunista Lauro Jardim informa no Globo que o DPVAT entrou na mira do governo, e as consequências começam a aparecer. A seguradora Líder, consórcio que administra o DPVAT, tomou um tombo na virada do ano. Das 67 seguradoras que integravam a empresa, 19 pediram desligamento. Uma turma de graúdos que inclui Mapfre, BTG, AIG Zurich, Icatu, Chubb e Swiss Re.

Esse tema deve permanecer nas manchetes por um bom tempo ainda, principalmente em ano eleitoral. Mas quem realmente deveria ser o foco a discussão é a sociedade, que tem sofrido com o uso indevido dos impostos que paga. Se esse erro for corrigido, com impostos sendo usados para o bem da sociedade, com escolas boas, prestação de saúde básica, segurança em todos os sentidos… desde poder andar na rua com um celular na bolsa até escoar a produção de alimentos por modais decentes, ai sim o Brasil e o setor de seguros mudarão de patamar, protegendo realmente a riqueza de um país desenvolvido que um dia poderá ser o Brasil.

Denise Bueno
Denise Buenohttp://www.sonhoseguro.com.br/
Denise Bueno sempre atuou na área de jornalismo econômico. Desde agosto de 2008 atua como jornalista freelancer, escrevendo matérias sobre finanças para cadernos especiais produzidos pelo jornal Valor Econômico, bem como para revistas como Época, Veja, Você S/A, Valor Financeiro, Valor 1000, Fiesp, ACSP, Revista de Seguros (CNSeg) entre outras publicações. É colunista do InfoMoney e do SindSeg-SP. Foi articulista da Revista Apólice. Escreveu artigos diariamente sobre seguros, resseguros, previdência e capitalização entre 1992 até agosto de 2008 para o jornal econômico Gazeta Mercantil. Recebeu, por 12 vezes, o prêmio de melhor jornalista de seguro em concursos diversos do setor e da grande mídia.

1 COMENTÁRIO

  1. Boa tarde!
    Após tanto sensacionalismo e falta de conhecimento do Seguro DPVAT, pelos órgãos fiscalizadores e políticos. Uma matéria que vale a pena ler e refletir.

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