Blockchain provocará tsunami no setor de seguros

por Márcia Alves

No terceiro evento da série “Tecnologias disruptivas e seus impactos no seguro”, promovido pela APTS e a ENS, dia 29 de agosto, em São Paulo, o tema em debate foi Blockchain. Esta nova tecnologia, uma das mais disruptivas, tem potencial para causar um tsunami no setor de seguros, segundo o CEO da 88 Insurtech, Rodrigo Ventura. Na palestra de abertura do evento, ele explicou que o blockchain é um protocolo de segurança, comparado a uma espécie de livro contábil, que registra todas as operações financeiras.

A mudança mais impactante provocada por essa nova tecnologia, segundo Ventura, é a possibilidade de regular sinistro em tempo real, promovendo o imediato pagamento da indenização. Ele deu o exemplo de uma pessoa que está no aeroporto e recebe uma propaganda sobre seguro viagem direcionada por geolocalização para o seu celular. A pessoa adquire o seguro e, por causa do atraso do voo, já enfrenta o primeiro sinistro. Sem que o segurado precise avisar, a seguradora confirma o atraso e comunica o pagamento do sinistro ao segurado. “Não houve aviso de sinistro e nenhum intermediário na operação. Este é o impacto do blockchain”, disse.

Com a eliminação do aviso de sinistro e o pagamento imediato da indenização, Ventura prevê que não haverá mais conflitos entre segurados e seguradoras. Consequentemente, a arbitragem será desnecessária, bem como qualquer outro meio de resolução de conflito. Com o blockchain, também será possível acessar em tempo real os dados de seguradoras relacionados a números de contratos e sinistralidade, algo que, no presente, o órgão regulador tem acesso seis meses após o fechamento do ano fiscal.

Inovação – Wellington Lordelo, gerente de Solution Marketing & Business Development na Equinix, mostrou como o blockchain está avançando no mundo com a exposição de 50 casos de usos em diferentes segmentos. Em alguns países da Comunidade Europeia, por exemplo, o blockchain serve para o controle de fronteiras, validando passaportes em tempo real.

O mercado de seguros mundial também aderiu ao blockchain. Um dos projetos em curso, segundo Lordelo, é o Product rollout on RiskBlock platform, no qual seguradoras se juntaram para fazer a automação do processo de sinistros. A aplicação permite aos condutores de veículos motorizados e policiais confirmarem a precisão da cobertura de seguro em tempo real sem depender de formulários em papel.

Outro exemplo é o aplicativo de seguro paramétrico que usa previsões climáticas e contratos inteligentes para automatizar o processo de sinistros. “A tecnologia pode também revelar o perfil de condução do veículo. Se um motorista tem perfil mais agressivo que outro, não pode pagar prêmio igual, os riscos são diferentes. Isto significa a customização do seguro”, disse.

Embora a demanda dos consumidores esteja forçando as seguradoras a inovarem em ritmo mais rápido, a questão é que, segundo Lordelo, boa parte dessas empresas ainda não está pronta para a transformação digital. “Mas precisam, porque essa é a oportunidade para se interconectarem com outros players. As empresas que não fizerem isso a partir de agora, terão dificuldades para acelerarem seus processos de inovação no futuro”, disse.

Grande inovação – Fernando Wosniak Steler, CEO e fundador da Direct.One, coloca o blockchain ao lado de grandes inovações da humanidade, como a internet, a Revolução Industrial, e a invenção da prensa, por Gutenberg, que mudaram a vida da sociedade ao preencherem gaps. No caso do blockchain, ele afirma que o gap é a troca de valores, que ainda é feita da mesma forma desde a invenção do dinheiro.

Da mesma forma que a internet enfrentou um período de maturação, o blockchain também entra agora nessa fase, dez anos depois de sua criação. Dentre as aplicações, Steler destacou o digital assets, que torna a liquidação mais rápida e barata na medida em que elimina os intermediários mais lentos. Outra é o smart contracts, que tem potencial para digitalizar e automatizar os atuais contratos estáticos ou em papel.

Steler apresentou o case Sura, em que a Direct.One faz a entrega de e-mail e documentos com comprovação em smart contracts. O registro em blockchain comprova data e hora, fornece a prova de conteúdo e assinaturas com arquivos criptografados. Ele lembrou que desde janeiro está em vigor a Resolução 359 do CNSP sobre meios remotos, que viabiliza o blockchain ao estabelecer que a emissão de apólices deve contemplar meios de conferir a autenticidade.

Segundo Steler, está claro que a Susep substituiu o certificado digital pelo blockchain. “Nada muda para o consumidor, que continuará a receber um pdf. No entanto, esse documento virá com a numeração de blockchain que poderá ser conferida em um analisador público de blockchain. Para a seguradora, significa mais agilidade e transparência”, disse.

Ferramenta poderosa – Eduardo Guedes, vice-presidente de Tecnologia e Operações na Seguros Sura, informou que a seguradora adota blockchain para gravação e envio de apólices, endossos e boletos na forma de smart contracts. “Os contratos inteligentes tem tudo a ver com a nossa indústria, com as apólices, os eventos de riscos, os registros, acionamento de assistência, indenização etc.”, disse.

Uma das vantagens do blockchain, segundo ele, é o compartilhamento de registros. “Posso ter todas as informações do cliente, sem saber quem ele é, e compartilhá-las, criando padrões e regras únicas para a operação de todo o mercado”, disse. Além do ganho de eficiência, Guedes destaca que essa rede pode ser pública ou privada, envolvendo, por exemplo, somente seguradoras, corretoras e resseguradoras. “Mas, se houver um repositório em que a informação de risco seja pública e as regras comuns, então o blockchain poderá revolucionar esse mercado”, disse.

Por enquanto, o blockchain não tem gerado ganhos financeiros para as seguradoras. Mas, Guedes indicou serviços que podem rentabilizar essa tecnologia, como, por exemplo, as vistorias e avaliações de riscos. “Na central de bônus, por exemplo, poderia ser utilizado o blockchain público, com controle de acesso, contendo todos os registros das apólices”, disse.

Por outro lado, ele considera que algumas questões precisam ser resolvidas para o uso de blockchain. Em relação à performance e escala, o executivo destaca que o blockchain é mais lento que um banco de dados, a criptografia consome processamento e a replicação de dados consome armazenagem. O custo também pode aumentar dependendo do número de transações. “Então, não é tão rápido e tão simples. Mas, é muito útil e muito poderoso”, disse.

Parceria – Durante o evento, o diretor Geral da Escola Nacional de Seguros (ENS), Renato Campos Martins Filho, ressaltou que a missão da entidade é o desenvolvimento do mercado de seguros por meio da qualificação dos profissionais. “Toda a entidade que também tenha essa missão é parceira da Escola”, disse. Osmar Bertacini, presidente da Associação Paulista dos Técnicos de Seguro (APTS) reconheceu a importância da parceria. “Disseminar o conhecimento é a missão da APTS, que agora conta com o valioso apoio da ENS”, disse.

Denise Bueno
Denise Buenohttp://www.sonhoseguro.com.br/
Denise Bueno sempre atuou na área de jornalismo econômico. Desde agosto de 2008 atua como jornalista freelancer, escrevendo matérias sobre finanças para cadernos especiais produzidos pelo jornal Valor Econômico, bem como para revistas como Época, Veja, Você S/A, Valor Financeiro, Valor 1000, Fiesp, ACSP, Revista de Seguros (CNSeg) entre outras publicações. É colunista do InfoMoney e do SindSeg-SP. Foi articulista da Revista Apólice. Escreveu artigos diariamente sobre seguros, resseguros, previdência e capitalização entre 1992 até agosto de 2008 para o jornal econômico Gazeta Mercantil. Recebeu, por 12 vezes, o prêmio de melhor jornalista de seguro em concursos diversos do setor e da grande mídia.

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