Não ter jornalistas especializados em seguros é a principal queixa dos CEOs de empresas do mercado segurador. Uma pesquisa da BB Seguros com cerca de 30 jornalistas do Brasil revelou que somente três deles se declararam realmente especializados. “Temos mais de 100 notícias no clipping, mas quando peneiramos restam duas ou três relevantes”, comentou um CEO em conversa em off. “Fazemos eventos com pautas interessantes, mas o jornalista da grande imprensa não aparece”, comentou outro CEO.
E por que isso acontece? As respostas mais rápidas apontam para a complexidade do setor, a demora em dar retorno para entrevistas, a pressão de assessorias antes e depois das entrevistas, a falta de conteúdo de interesse público (acionistas, analistas e consumidores) e pelo tema não dar Ibope com leitores e, consequentemente, com os diretores de redação. Mas essas justificativas são muito superficiais. Vale uma boa reflexão para todos.
Não sei nos outros setores, mas se todos os grandes produtores de conteúdo, como Exame, Agência Estado, Globo, Folha e Reuters entre outros passarem a pressionar e punir quem copia e cola o material produzido, como o Valor tem feito, 80% dos sites de seguradoras, sindicatos, corretoras e mídia especializada ficarão totalmente sem notícia para compartilhar ou atualizar a própria página. E quem duvidar, faça um levantamento sobre conteúdo próprio, release e conteúdo de terceiros. Se não receberem mais release, ai a coisa complica de vez. Com certeza se isso acontecesse, iria ajudar a desenvolver uma grande leva de jornalistas especializados em seguros e iria ensinar a todos o quanto é gratificante ter conteúdo de qualidade para formar profissionais de ponta. Pois a notícia existe. Só que ninguém se anima em se aprofundar no tema e publicá-la por falta de estímulo. Pense em quantas teses são defendidas pelos profissionais do mercado. Só isso geraria matéria interessante o ano todo.
Um vice-presidente de uma das maiores seguradoras me perguntou: você acha certo o Valor pressionar as empresas de clipping e não permitir que se reproduza o conteúdo dele? Isso vai contra a internet de hoje. Respirei e pacientemente expliquei como funciona o capitalismo. Que se o Valor não for remunerado pelo conteúdo que produz ele fechará as portas e dai todos ficarão sem conteúdo. Mesmo a seguradora que decide pelo robô do Google onde colocar seus anúncios, não terá mais opções, pois hoje a maioria dos sites, portais e blogs escolhidos pelo Google tem como base o acesso, que é alto em razão das notícias publicadas por Valor, Folha, Estado e Globo clipadas por sites, blogs e portais. Se tirar esse conteúdo, praticamente não resta nada de interessante para o leitor além de releases que massageiam o ego de executivos. Parece que o executivo entendeu a importância de ter conteúdo de qualidade e que é preciso recursos desenvolver bons jornalistas. Recursos para estudar, para pesquisar, para dedicar horas a uma investigação.
Acredito que está quase lá o momento de todos perceberem que comunicação de qualidade é tudo de bom. Nos últimos cinco anos, as seguradoras investiram muito em comunicação, marketing e propaganda. Contrataram assessorias de imprensa, lançaram portais, produziram cartilhas. Agora é o momento de qualificar a quantidade que produziu. Quantas vezes estou em eventos e tenho de apresentar CEOs ou porta vozes destacados para diretores de comunicação e marketing. E jornalistas de grandes veículos para a assessora de imprensa!!!!
Sério, acreditem. Investir em comunicação fora da caixa da publicidade e do marketing traz benefícios incríveis. E portais fantásticos, como Business Insurance, Lloyds List, Asia Insurance Reviews, Insurance Day, Inform, BNAmericas, Reactions. Todos com conteúdo pago. E por isso conseguem se dedicar a produzir reportagens que prendem o leitor do começo ao fim. Que ajudam a criar uma estratégia nova. Mudar um processo. Inovar.
Claro que ter quase todas as empresas da indústria listadas em bolsa ajuda na pauta dos portais estrangeiros. Mas as dez maiores seguradoras no Brasil tem controlador com ações em bolsa em algum continente. E por estar o mercado brasileiro amadurecendo, carece de matérias que difundam o conhecimento, divulguem estudos, análises. Tudo bem ter release. Mas que eles pautem os jornalistas e não seja cobrado que se divulgue na íntegra para aumentar a centimentragem do trabalho da assessoria. Tudo bem ter matéria que infla o ego do executivo. Faz parte. Mas que transmita algo sobre liderança. Enfim, convido a todos pensar à respeito sobre a produção de conteúdo de qualidade.
Uma coisa certa é: não tem almoço grátis, como dizia o economista liberal Milton Friedman. Tudo tem um custo – mesmo que ele não seja visível a olho nu. Agora, se quiser manter essa estatística, de 3 (três) jornalistas especializados para um setor que movimenta mais de R$ 330 bilhões em vendas, tem 115 seguradoras, 122 resseguradoras, 150 mil trabalhadores diretos e 80 mil corretores entre outros dados…Fazer o quê. Se nada for feito, continuará assim. Poucos jornalistas especializados. Só em grandes catástrofes o setor ocupa a grande mídia ou pagando caro para sair em especiais de grandes veículos com matérias próximas de releases.