A transformação digital tem trazido avanços inéditos para a indústria de seguros, com tecnologias como inteligência artificial (IA) generativa, big data e estratégias de cibersegurança assumindo um papel central. No painel “Tendências de Inovação para a Indústria de Seguros”, especialistas exploraram como essas inovações estão moldando o setor, mas também alertaram para os desafios éticos e de segurança que acompanham essa modernização.
Caroline Dunn, Chief Underwriting Officer da Zurich no Reino Unido, discutiu o impacto da IA generativa no aprimoramento da modelagem de riscos. A Zurich tem utilizado mais de 27 fontes de dados externas para prever cenários, como riscos de incêndio, com base em variáveis que incluem localização e atividades dos vizinhos. “Combinando dados externos com nossos próprios registros, conseguimos uma visão mais detalhada do perfil de risco dos clientes”, explicou. Segundo ela, a IA não apenas amplia a capacidade de antecipação de riscos, mas também auxilia na personalização da precificação e aceitação dos seguros.
Richard Vinhosa, CEO da EZZE Seguros, destacou o potencial da IA para a análise de comportamento dos clientes, o que ele acredita ser fundamental para oferecer soluções que atendam melhor às necessidades dos segurados. No entanto, ele alerta que o desenvolvimento contínuo de inovação requer investimentos em tecnologia, que atualmente representam cerca de 10% dos recursos das seguradoras, dados os altos custos de sinistros e comissões.
Com o aumento dos ataques cibernéticos, o setor de seguros enfrenta o desafio de proteger dados e fornecer segurança aos clientes. Luke Foord-Kelcey, chefe global de Cibersegurança da Howden Re, explicou que sua equipe oferece serviços suplementares nas apólices, incluindo alertas de vulnerabilidade e recomendações para fortalecer a defesa dos sistemas corporativos. “A tecnologia de segurança cibernética evoluiu rapidamente, mas a maior vulnerabilidade ainda está nos colaboradores, então o treinamento constante se tornou essencial”, afirmou Luke.
Caroline apontou que, no Reino Unido, as seguradoras investem substancialmente na proteção de dados e na conscientização dos funcionários, considerando a crescente demanda por seguros cibernéticos que oferecem também serviços pré e pós-sinistro. Roberto Santos, presidente do conselho da CNseg, também alertou para os riscos internos no Brasil, como a coação de funcionários para a venda de dados, e reforçou a importância de regulamentações rigorosas e testes de vulnerabilidade contínuos para enfrentar essas ameaças.
O seguro cibernético é um produto relativamente novo, mas que tem se expandido rapidamente, destacaram os participantes. Caroline explicou que os clientes mais sofisticados buscam não só a indenização, mas também suporte técnico e jurídico em caso de invasões. Luke ressaltou que 80% das chamadas de emergência cibernética conseguem ser resolvidas em tempo real, mostrando que o mercado está preparado para atender as demandas, embora a diversificação da carteira de riscos ainda seja uma meta para reduzir a exposição sistêmica.
Richard apontou que o mercado ainda tem potencial de crescimento, especialmente entre empresas com grande exposição digital, como bancos e empresas de saúde, que compreendem a importância de um seguro cibernético. No entanto, ele alerta que muitos negócios ainda subestimam a necessidade de cobertura.
Questões éticas e regulatórias
Com o uso crescente de IA e big data, questões éticas também emergem, especialmente em relação à hiperpersonalização e discriminação. Miqdaad Versi, sócio da Oxbow Partners, argumentou que a personalização excessiva pode trazer impactos discriminatórios, algo que precisa ser abordado com regulamentações claras. “Algoritmos podem acentuar desigualdades sem que percebamos, discriminando inadvertidamente por fatores como raça ou localização”, afirmou Versi.
Ele detalhou dados de uma pesquisa sobre a maturidade da IA generativa nos mercados especializados e de resseguros, baseado em entrevistas com a liderança sênior de 22 das maiores resseguradoras, seguradoras e players especializados do mundo, realizadas entre abril e maio de 2024. O estudo revelou que as seguradoras atualmente não estão preparadas para adotar inteligência artificial (IA) generativa em seus modelos operacionais. O relatório, publicado em julho de 2024, mostrou que a pontuação média atribuída pelas seguradoras para seu nível de preparo em adotar IA generativa foi de apenas 5,2 em 10.
A maioria (80%) dos respondentes também destacou que os objetivos estratégicos de suas empresas são a maior barreira para a adoção da IA generativa. Enquanto isso, muitos outros participantes da pesquisa indicaram que estão adotando uma posição de “esperar para ver”, realizando investimentos em capacidades fundamentais, mas observando ativamente onde outros estão progredindo.
Richard destacou a importância de um arcabouço legal robusto que proteja os clientes e defenda os princípios éticos, lembrando que a tecnologia é um meio e não um fim. “A responsabilidade de garantir práticas éticas cabe a todos no setor, pois é sobre as pessoas que estamos falando, e não apenas sobre tecnologia”, concluiu.
A transformação digital na indústria de seguros promete oferecer soluções mais personalizadas e seguras aos clientes, desde a prevenção de sinistros até a resposta a ataques cibernéticos. Contudo, a modernização vem com o desafio de proteger dados e garantir que a IA seja usada de forma ética. No Brasil e no mundo, os líderes do setor buscam equilibrar inovação e responsabilidade, conscientes de que uma abordagem sólida e ética será fundamental para conquistar a confiança dos consumidores e manter o setor de seguros relevante e resiliente.