É urgente desenvolver o mercado de seguros diante das necessidades impostas pelas questões climáticas, afirmou Marcos Falcão, CEO do IRB (Re), na abertura do 1º Fórum IRB (P&D), realizado na manhã desta quarta-feira (11/09), no Rio de Janeiro, com o tema “Desafios e Oportunidades no Enfrentamento dos Riscos Climáticos”.
Falcão tem razão. As estimativas apresentadas no principal evento de resseguros realizado em Monte Carlos, Mônaco, são assustadoras. Apontam para uma necessidade de financiamento de aproximadamente US$ 37 trilhões entre agora e 2030, considerando três desafios. Somente a mudança climática exigirá cerca de US$ 25 trilhões no mesmo período, enquanto tudo relacionado à IA generativa e digitalização demandará US$ 7 trilhões, e o envelhecimento das sociedades representará outros US$ 5 trilhões.
“Os dados mostram que o risco precisa ser encarado de frente. Nossa missão é pagar sinistros e precificar corretamente para sermos perenes e seguros. Isso é gestão de riscos. Recentemente, vivenciamos eventos extremos no Rio Grande do Sul, onde ficou evidente a discrepância entre as perdas econômicas e seguradas. Já temos uma legislação apropriada em evolução e soluções de mercado baseadas no princípio da mutualidade, o que contribui para esse progresso e gerenciamento. Contudo, ainda há muito a ser feito, sobretudo devido ao agravamento dos riscos climáticos. A colaboração entre o setor público e privado é essencial”, afirmou Falcão.
Dyogo Oliveira, presidente da CNseg, concorda com Falcão. “Somos a indústria com maior capacidade de avaliar riscos, e o setor não pode se esquivar dos eventos extremos. Precisamos compreendê-los para gerenciá-los adequadamente. É fundamental que o mercado se una para acumular e compartilhar conhecimento”, disse.
Para Oliveira, as seguradoras enfrentam três desafios principais no combate aos riscos climáticos: o primeiro está relacionado aos produtos de seguro já existentes, que ainda são subutilizados; o segundo, à necessidade de desenvolver novos produtos; e o terceiro, à integração com programas públicos e agendas governamentais. “É lamentável que menos de 10% das perdas totais no Rio Grande do Sul estejam cobertas. Há um vasto campo a ser explorado com produtos já existentes, como Seguro Agrícola, Residencial e Automóvel”, ressaltou.
Oliveira destacou que o setor segurador vem tratando dos riscos climáticos desde a década de 1970, sendo o primeiro segmento econômico a chamar atenção para o tema. “Mas é necessário um esforço ainda maior para preparar o mercado, pois os riscos estão crescendo e continuarão a crescer. Isso não é pessimismo, mas uma constatação de que a transição climática já está em curso e não irá retroceder”, observou. A CNSeg tem atuado em cooperação com o mercado, governo, universidades e institutos de pesquisa, além de inserir o tema nas agendas internacionais, como nas discussões da Conferência da ONU sobre Mudanças Climáticas e do G20.
Amauri Vasconcelos, CEO da Brasilseg, também destacou a importância da gestão de catástrofes e do papel dos seguros nesse contexto: “O poder destrutivo das calamidades climáticas é imenso, como vimos no Rio Grande do Sul. É essencial educar a população, inclusive sobre previdência privada, para promover a longevidade e garantir o equilíbrio social. O setor está pronto para essa missão, mas precisamos encontrar formas de sensibilizar a sociedade”, afirmou. Segundo ele, as perdas por eventos climáticos no agronegócios nos últimos dez anos somaram R$ 287 bilhões, sendo que apenas R$ 56 bilhões tinham seguros agrícolas ou reembolsos do governo com o Programa de Garantia da Atividade Agropecuária (Proagro).
Governo: inovação e educação financeira
Vinicius Ratton Brandi, subsecretário de Reformas Microeconômicas e Regulação Financeira do Ministério da Fazenda, frisou o desafio de aprofundar o conhecimento sobre riscos climáticos. “O debate é acadêmico. Precisamos unir desenvolvimento e conhecimento, combinando conceitos e técnicas que também contribuam para questões regulatórias. Todos os setores, especialmente o de seguros, devem desenvolver ferramentas adequadas para mitigar os riscos climáticos”, disse.
Paulo Miller, chefe de coordenação geral de estudos e relações institucionais da Susep, destacou a importância da educação financeira em todos os níveis, desde o acadêmico até a conscientização da população sobre a gestão de riscos climáticos. “É necessário desenvolver a compreensão do poder público sobre como o seguro pode mitigar riscos. O seguro tem um papel fundamental no apoio a catástrofes, tanto na gestão de riscos quanto no suporte financeiro imediato em eventos como o ocorrido no Rio Grande do Sul ou no litoral norte de São Paulo no Carnaval de 2022”, pontuou.
Miller também mencionou inovações como o seguro paramétrico. “Esse tipo de seguro pode resolver vários gargalos de proteção no agronegócio. A oferta de seguro embutido pode avançar, lembrando o consumidor da proteção financeira no momento da compra de uma semente, por exemplo. Inovações como essa podem mitigar riscos e oferecer conforto a quem enfrenta perdas”, acrescentou.
Ciência: urgências climáticas
O cientista Carlos Nobre alertou sobre o cenário preocupante para a humanidade caso os impactos das mudanças climáticas não sejam enfrentados com urgência. “Os impactos já são generalizados e estão se intensificando. Não falamos mais de mudanças climáticas, mas de emergência climática”, afirmou. Nobre apresentou dados sobre o aumento das temperaturas, o nível do mar, o derretimento das geleiras e o aumento dos gases de efeito estufa.
“Tivemos recordes de queimadas neste primeiro semestre, recorde de inundações no Sul e recorde de seca na Amazônia. Precisamos nos adaptar aos eventos climáticos extremos”, destacou. Entre as estratégias sugeridas estão a melhora da eficiência energética, a promoção de energias renováveis, o incentivo ao transporte público sustentável e a restauração de vegetações e áreas costeiras.
Segundo ele, o Brasil pode neutralizar as emissões de gases de efeito estufa com políticas ambientais bem implementadas, atingindo emissões líquidas negativas após 2040. “Os setores devem caminhar rumo à sustentabilidade, transição energética e aprimorar os sistemas de previsão e alertas de desastres”, afirmou Nobre, que também é membro do Conselho Deliberativo do WWF Brasil.
Ao final, o cientista questionou: “Que mundo vamos deixar para as próximas gerações?” Ele enfatizou a importância de as novas gerações assumirem a liderança na busca por sustentabilidade e a inclusão do ensino sobre eventos climáticos extremos nas escolas.
Cresce a demanda por cat bonds
Roberto Carcache-Flores, gerente de riscos na VITALIS, falou sobre o crescimento dos “cat bonds” ou títulos para proteção de catástrofes, mencionando o furacão Katrina como exemplo de uso desse instrumento financeiro. “Os cat bonds geraram US$ 7 bilhões em 2022 pelas perdas em Nova Orleans. O mercado, iniciado em 1997, registrou crescimento superior a 20% em 2023, totalizando US$ 43 bilhões”, explicou.
Segundo ele, esses títulos permitem que resseguradores e governos locais transfiram riscos ao mercado financeiro, oferecendo aos investidores a oportunidade de diversificar seus portfólios.
Como criar tesiliência em um mundo em risco?
Simon Solvsten, diretor do European Center for Risk & Resilience Studies, destacou que a construção da resiliência do futuro requer financiamento e que os desafios incluem o aumento da frequência e gravidade dos eventos climáticos extremos. “A urgência está em reduzir as lacunas de cobertura e o sub-seguro, especialmente em mercados emergentes. Além disso, as seguradoras precisam se adaptar a novas tecnologias, como a IA, para enfrentar os desafios futuros”, concluiu.