Tragédia do Sul interrompe ciclo de alta do lucro das seguradoras em maio de 2024

Apesar da sutileza do recuo nos cinco primeiros meses deste ano, de apenas 0,7%, estanca um aumento que vinha na casa dos dois dígitos há tempos, conforme estudo da Siscorp

As perdas com pagamentos de indenizações com a tragédia no Rio Grande do Sul interromperam a alta do lucro das seguradoras observada há anos. No passado recente, apenas a pandemia e a marcação a mercado de títulos mobiliários tinham impactado o ganho das companhias de seguros. De janeiro a maio deste ano, o ganho informado à Superintendência de Seguros Privados (Susep) foi de R$ 11,3 bilhões, ligeiramente inferior aos R$ 11,4 bilhões do mesmo período do ano anterior.

Apesar da sutileza do recuo nos cinco primeiros meses deste ano, de apenas 0,7%, ele estanca um aumento que vinha na casa dos dois dígitos há tempos, conforme estudo da Siscorp. Com a Covid-19, o setor registrou baixa no lucro líquido por dois anos. Em 2019, o lucro foi de R$ 17,9 bilhões. Em 2020, R$ 14,4 bilhões. Em 2021, R$ 8,3 bilhões, tendo como pano de fundo a Covid-19, que gerou indenizações acima de R$ 7 bilhões.

Em 2022, o lucro avançou 118%, para R$ 18,1 bilhões. Além de comparado a uma base sofrida, foi impulsionado pelos ganhos operacionais com a digitalização, incrementada pelas seguradoras aos tempos de homeoffice, e a alta dos juros. Em 2023, o lucro líquido avançou 65,7%, para R$ 29,9 bilhões.

A arrecadação do setor de seguros no Brasil de 2019 a 2023 foi marcada por um crescimento constante: 2019, R$ 270 bilhões; 2020, R$ 306 bilhões; 2021, R$ 357 bilhões; 2022, R$ 356 bilhões; e 2023, R$ 388 bilhões, sem considerar o segmento de saúde.

A queda do lucro em 2024 deverá ser mais evidente nos meses de junho e julho, quando se espera o anúncio de um volume maior de indenizações pagas aos clientes com perdas no Sul. De acordo com a CNseg, confederação das seguradoras, a expectativa de indenizações solicitadas pelos segurados com as perdas no Rio Grande do Sul é de R$ 3,88 bilhões considerando-se 48,8 mil pedidos, segundo dados divulgados no relatório até o dia 18 de junho. Esse valor significa apenas os “sinistros avisados”. Depois da regulação das perdas pelos reguladores de sinistros próprios ou contratados pelas seguradoras, o número pode avançar ou recuar. A expectativa da CNseg é de avanço deste valor, com a chegada de novos avisos no decorrer dos meses.

Fora isso, apenas não houver novos imprevistos as seguradoras devem encerrar o ano com lucro em alta, uma vez que a Selic, que remunera praticamente a totalidade da carteira de investimentos do setor, estimada em mais de R$ 1,5 trilhão, se mantém em alta. A longa duração dos títulos do governo em carteira também garante um ganho financeiro significativo em 2025, mesmo que as taxas de juros recuem.

De acordo com o ranking de lucro líquido elaborado pela consultoria Siscorp, a disputa pela liderança segue entre a BB Seguros, que reúne as empresas de seguridade do Banco do Brasil, e o grupo Bradesco Seguros, empatadas com R$ 2,2 bilhões. Apenas cerca de R$ 60 milhões separam a primeira da segunda colocada. No entanto, como as indenizações a serem pagas pela tragédia do Sul, é possível que Bradesco volte ao topo no balanço do primeiro semestre, diante da liderança do segmento em seguro rural da BB Seguridade.

Analistas de bancos já começam a calcular as perdas das seguradoras com as indenizações pagas pelas perdas no Sul, que ainda estão apenas começando a ser lançadas nos balanços. De olho no índice de sinistralidade, o Bradesco BBI informou em seu relatório sobre o setor que o seguro de vida foi o único que não mostrou um aumento acentuado na taxa de sinistralidade, com os segmentos habitacional e rural sendo os maiores destaques negativos.

A Caixa Seguridade é mais exposta no segundo de seguro habitacional, a BrasilSeg em seguro rural e a Porto em seguro automóvel, três linhas mais afetadas. De acordo com o BBI, Brasilseg e Porto mostraram deteriorações nas margens de subscrição de 5,4 pontos percentuais (pp) e 4,1 pp, para 38% e 21%, respectivamente.

A Caixa Seguridade informou que estima um potencial impacto negativo de R$ 342,2 milhões relacionado ao provisionamento de sinistros de seguro prestamista de sua investida XS1, o que deve se traduzir em um impacto negativo de R$ 123,2 milhões relacionado ao resultado de equivalência patrimonial do 2T24.

Segundo o documento, a XS1, que detém ações das seguradoras XS2 e Caixa Vida e Previdência, recebeu da Caixa Econômica Federal um banco de dados contendo uma lista de pessoas falecidas que figuravam como titulares de contratos de crédito, resultando assim no provisionamento dos sinistros do seguro prestamista entre maio e junho de 2024. A Caixa Seguridade informou ainda que o pagamento aos beneficiários desses contratos ainda estará sujeito à apresentação dos documentos exigidos em até 180 dias, sendo que, ao final deste período, essas provisões poderão ser baixadas e revertidas, embora ainda possam ser reabertas dependendo dos prazos legais, relatou o Infomoney em reportagem.

Já o Itaú BBA destaca que o índice de sinistralidade geral do BB Seguridade aumentou em 31 pontos percentuais na base anual para 53%, impulsionado por aumentos acentuados nas linhas de Hipoteca e Rural, impactados pelas enchentes no sul do Brasil. Em maio, todas as principais linhas de seguros da seguradora mostraram uma diminuição anual nos prêmios emitidos. Por enquanto, o desempenho no trimestre em termos de prêmios sugere um desvio de mais de 10% em relação às estimativas do BBA.

A Genial Investimentos comenta que a Porto apresentou uma deterioração significativa do índice de sinistralidade, chegando a 63% no mês. No entanto, a piora na sinistralidade da empresa é bem inferior aos pares mais expostos as regiões afetadas como a HDI, que apresentou uma sinistralidade de 95,6%.

Além da piora na sinistralidade, a Genial destaca que a Porto apresentou um fraco desempenho nos prêmios emitidos que ficaram estáveis na comparação anual (-0,1%), levando a uma perda de participação de mercado de 0,3 pp na base anual. Segundo estimativas, esse evento irá resultar em um impacto de aproximadamente R$ 94 milhões no lucro da Porto em 2024, representando cerca de 4% das estimativas para o lucro do ano. Apesar da queda na estimativa de lucro, a Genial reiterou recomendação de compra e preço-alvo de R$ 35.

O BBA destaca que o índice de sinistralidade diminuiu 20 pontos percentuais na base para 35%. Segundo o BBA, apesar do impacto das enchentes nas linhas de Auto, Residencial e corporativas, a empresa mais do que compensou isso com uma reversão nas provisões no seguro de Vida e Vida de Crédito, ambos mostrando um índice de sinistralidade negativo de 23%.

“O lucro líquido de maio foi afetado por sinistralidades mais altas na operação de automóveis, enquanto Vida e Previdência, apesar de um índice de sinistralidade mais baixo, ainda viu uma queda na base anual devido a maiores reversões no ano anterior”, explica BBA. Os números do trimestre até a data mostram uma queda de 34% no lucro da operação de automóveis e uma queda de 26% na operação de Vida e Previdência.

Denise Bueno
Denise Buenohttp://www.sonhoseguro.com.br/
Denise Bueno sempre atuou na área de jornalismo econômico. Desde agosto de 2008 atua como jornalista freelancer, escrevendo matérias sobre finanças para cadernos especiais produzidos pelo jornal Valor Econômico, bem como para revistas como Época, Veja, Você S/A, Valor Financeiro, Valor 1000, Fiesp, ACSP, Revista de Seguros (CNSeg) entre outras publicações. É colunista do InfoMoney e do SindSeg-SP. Foi articulista da Revista Apólice. Escreveu artigos diariamente sobre seguros, resseguros, previdência e capitalização entre 1992 até agosto de 2008 para o jornal econômico Gazeta Mercantil. Recebeu, por 12 vezes, o prêmio de melhor jornalista de seguro em concursos diversos do setor e da grande mídia.

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