por Jamille Niero, do InfoMoney
O Brasil já o segundo país com mais registros de pagamentos instantâneos do mundo. Segundo o Banco Central, por meio do Pix, já foram realizadas mais de 29 bilhões de transações.
Contudo, a facilidade desse tipo de transação financeira tem atraído golpistas e até sequestradores que se aproveitam para cometer crimes, como o que aconteceu com João, nome fictício de uma vítima de sequestro-relâmpago, que teve um prejuízo de mais de R$ 60 mil retirados de sua conta bancária pelos sequestradores, utilizando o Pix.
João relatou sua história no mais recente episódio do videocast Tá Seguro, disponível no YouTube, no canal do InfoMoney, e nas principais plataformas de podcast (clique aqui para ouvir no Spotify). No programa, ele narra que ficou quase 24h em poder dos sequestradores, que o levaram em um carro e o deixaram em cativeiro enquanto faziam os trâmites bancários utilizando as senhas e o seu celular.
“Demorou algumas horas para eu entender o que estava acontecendo. Eu só sabia que eles estavam com meu celular. E por volta das 6h da manhã, eu sei disso porque a televisão ficou ligada o tempo todo e eu escutava os programas, entraram novas pessoas no lugar e me mandaram ajoelhar e colocaram o meu celular, na minha frente, apontaram a arma para mim e falaram pra eu olhar pra tela. Eu imaginei que eu estava fazendo um reconhecimento facial, e que eles estavam de alguma forma fazendo algo com a minha conta bancária, só que eu não sabia o que era”, conta.
Após ser solto em uma rua residencial, sem o celular e sem seu carro, próximo a uma pizzaria, ele chamou a polícia e conversou também com a mãe, orientando-a a bloquear o acesso a e-mails e redes sociais, além de ligar para o banco para tentar entender o que houve com sua conta. Isso aconteceu na passagem de sexta-feira para sábado, às vésperas de um feriado que seria na terça-feira.
“Minha mãe ligou para o banco e falaram que a conta estava bloqueada. Então eu teria que esperar realmente até a terça-feira para ir até a minha agência e conversar com a minha gerente para entender o que tinha acontecido, o que eles tinham feito na minha conta porque naquele momento eu só conseguia pensar que eles tinham conseguido entrar nos meus investimentos e arrancado tudo”, relembrou.
Quando ele foi ao banco, soube que os bandidos haviam usado a conta dele para pedir um empréstimo pelo aplicativo do banco no valor de R$ 150 mil. Com a entrada da quantia na conta quase que automaticamente, porque era um crédito pré-aprovado, os sequestradores passaram a fazer transferências (o Pix foi um dos formatos utilizados) de valores variados até o sistema do banco “estranhar” a movimentação e bloquear a conta. Mas até isso acontecer, eles conseguiram transferir cerca de R$ 60 mil.
De acordo com Ana Carolina Mello, vice-presidente de subscrição da seguradora AXA no Brasil, que também participou deste episódio do “Tá Seguro”, o seguro Pixnão cobre todas as situações, mas o caso ocorrido com João, sim, que é quando envolve a realização de transferências “obrigando” a vítima segurada a fornecer senhas e acessos por mecanismos como a biometria facial.
“Quando ele conta que ficou ali no cativeiro, pediram as senhas e pegaram a fotografia dele, que é uma biometria, e daí fizeram empréstimos, várias transferências, pode ser Pix, TED, DOC ou qualquer tipo de transferência, o seguro hoje está desenhado exatamente para esse tipo de situação. Para fazer para ele, o que eu vou chamar de ‘reembolso do valor’ que ele perdeu no banco, com essa ressalva do limite que está contratado. Praticamente todos os bancos oferecem a contratação. É um seguro barato, de R$ 2 a R$ 25, dependendo do limite contratado”, explica Mello.
Por outro lado, o seguro Pix não tem cobertura para casos em que não ocorra algum tipo de coação para obtenção de senhas. “Por exemplo, se você está no carro, alguém quebra o vidro, rouba o seu celular e consegue ele desvendar a sua senha. Sem você fornecer senha ou sem fornecer biometria ele entra no seu banco e faz um saque, uma transferência, isso não está coberto. Isso que a gente chama de engenharia social, que é o bandido descobrir a sua senha, é um outro tipo de seguro, é uma novidade que vem por aí, o mercado ainda tá estudando como fazer, mas hoje isso não tem cobertura”, esclarece Ana Carolina.
A colunista de Seguros do InfoMoney, Denise Bueno, ressalta que as seguradoras passaram a oferecer os seguros Pix quando os bancos melhoraram seus sistemas de segurança, o que ocorreu com a pandemia de Covid-19. “Porque eles começaram a ser muito cobrados pela população, justamente porque estava tendo muito sequestro [motivado pelo] Pix. E aí só depois que os bancos mudaram essa configuração de segurança é que a seguradoras entraram ofertando o seguro Pix, porque antes era muito risco”, afirma a colunista.
Denise ressalta que as seguradoras estão empenhadas em vender esse tipo de proteção e procuram formas, “mas elas também não vão vender qualquer coisa. Também têm que ter uma margem de segurança para lançar um produto, que é esse caso por exemplo do Pix. Hoje várias seguradoras oferecem esse seguro”, diz.
A colunista comenta ainda que, em entrevista recente com um dos quatro maiores bancos do Brasil, soube que a instituição bancária chegou a registrar aumento nas contratações dessa cobertura em 17% no início deste ano, com indenizações na faixa dos R$ 580 mil.
Ana Carolina, da AXA, explica que o processo para acionar o seguro e receber a indenização é bem simples e pode ser feito todo pelo meio digital, basta ter o boletim de ocorrência (B.O.), que serve como prova.
Cassio Gama, advogado especializado em seguros, reforça que um B.O. bem feito é muito importante em casos como o vivido por João. “Se ele contar com a ajuda de um advogado na hora é importante também, como vítima, porque as delegacias no Brasil não estão preparadas para acolher. Em situações como essa, numa véspera de feriado. Como ele foi acolhido na delegacia? Então não é descritivo suficiente, não é detalhado o suficiente. Então tem que ter um cuidado no B.O. Pode se fazer um digitalmente, em certas circunstâncias, mas não é o correto. Tem que ir à delegacia numa situação de violência como essa”.
Os especialistas que participaram do videocast forneceram dicas fundamentais para os interessados em contratar um seguro Pix:
- O primeiro ponto é sobre o valor de indenização contratado, que precisa estar alinhado com o risco de perdas financeiras, ou seja, uma quantia que vá fazer a diferença em uma situação como essa;
- O segundo ponto é a franquia, que é o valor que será descontado da indenização. É preciso avaliar se vale a pena ter um valor fixo ou uma proporção da cobertura contratada;
- O terceiro fator a ser observado é a carência, ou seja, em quantas horas, dias ou semanas o segurado poderá receber a indenização em caso de sinistro (quando o risco previsto acontece);
- É importante prestar atenção no prazo de pagamento, que é em quanto tempo o segurado receberá a indenização. A legislação do setor estipula um prazo máximo de 30 dias, mas dentro desse limite pode variar de seguradora para seguradora;
- Vale ainda ficar atento ao local de cobertura, se é válido para uma cidade, estado ou tem cobertura nacional (ou mesmo internacional, caso esteja viajando, por exemplo).
Todos esses pontos devem ser avaliados na contratação do seguro e precisam constar na apólice.