“Queda livre: a tragédia do caso Boeing” traz as investigações de perdas que já ultrapassam US$ 22,5 bilhões

Os programas de seguros envolviam as maiores companhias de seguros da Europa (Allianz, Zurich, Hannover entre outras) e de resseguros (Munich Re e Swiss Re entre outras), bem como a americana AIG

Os profissionais de seguros especializados em linhas aéreas lembram do lançamento do “espetacular 737 MAX”, lançado em 2017 e que rapidamente passou a ser a aeronave mais vendida pela fabricante americana Boeing. A credibilidade da empresa era tamanha em tempos passados, que as pessoas chegavam a dizer: Se não for Boeing, eu não vôo.

Até que ocorreram dois acidentes com o 737 MAX em um período de 5 meses. Eles tiraram a vida de 346 pessoas e até hoje são investigados. Detalhes da investigação estão numa produção do Netflix: Queda livre: a tragédia do caso Boeing, do documentarista Rory Kennedy. Pouco se fala do seguro no filme e também nos bastidores do setor, com a alegação de que são contratos confidenciais. O seguro de responsabilidade civil, também o mais custoso, nunca são divulgados abertamente, pois envolvem negociações multilaterais com famílias e demais afetados.

O documentário detalha os bastidores antes, durante e depois dos acidentes. O voo 610 com a nova aeronave 737 MAX decolou de Jacarta com destino a Pangkal Pinang, com 189 passageiros, em 29 de outubro de 2018. Treze minutos depois, caiu no mar, completamente destruído. Foram levantadas questões sobre o design e, em particular, o software em uso no MAX, mas a Boeing garantiu aos clientes e passageiros que era seguro.

No entanto, foi por omissão da fabricante e das autoridades que um novo acidente nas mesmas condições aconteceu em menos de cinco meses depois, em 10 de março de 2019. O voo 302, da Ethiopian Airlines, com destino a Nairobi, no Quênia, caiu em terra cinco minutos após a decolagem com 157 pessoas a bordo. Havia semelhanças claras entre esses acidentes e, em poucos dias, um aterramento global do 737 MAX foi solicitado, afetando 387 aviões de 59 companhias aéreas.

A comunicação inicial da Boeing foi culpar as empresas aéreas e os pilotos, com lobistas atuando nos bastidores para configurar falha humana, algo que não impacta na imagem da empresa e o seguro geralmente é pago sem grandes problemas. Mas os registros das caixas pretas revelaram o esforço fenomenal dos pilotos para controlar as aeronaves. Foi quando surgiu uma sigla, MCAS, que pouquíssimas pilotos e técnicos conheciam.

Maneuvering characteristics augmentation system. Esse dispositivo corrige o ângulo do nariz da aeronave para que ela não empine demasiadamente e perca sustentação. Para não sobrecarregar os pilotos, a fabricante não deu detalhes do mecanismo deste sistema para pilotos, conta o filme. Em novembro de 2020, os aviões foram autorizados a voar novamente, após correções no projeto e treinamento dos pilotos. 

Custo total dos dois acidentes mortais são estimados em US$ 22,5 bilhões e sobem ano a ano

Os custos totais da fabricante com os dois acidentes já ultrapassam US$ 22,5 bilhões, segundo documentos judiciais divulgados pela mídia internacional, com base em dados fornecidos também no balanço da própria Boeing. Pelos números, apenas uma pequena parte destas perdas foram cobertas por seguros. O seguro serve para cobrir apenas um percentual de perdas da aeronave, tendo um limite máximo indenizável que geralmente representa até 30%, ficando o restante para outros instrumentos financeiros e garantias do segurador. Mas para contratos de Responsabilidade Civil não tem valor. Tem países que exigem valores de US$ 750 milhões em coberturas para indenizar terceiros. Depende das companhias aéreas e também do país. EUA são os mais exigentes, quanto a isso, explica o especialista em aviação, Gustavo Cunha Mello.

Os programas de seguros envolviam as maiores companhias de seguros da Europa (Allianz, Zurich, Hannover entre outras) e de resseguros (Munich Re e Swiss Re entre outras), bem como a americana AIG. Os custos da Boeing com estes dois acidentes sobem ano a ano. A maior parte das indenizações paga pelas seguradoras está nos contratos de seguros do pagamento das perdas das duas aeronaves, no acordo de responsabilidade civil de compensar os passageiros e no contrato de lucro cessante, com o fato de a frota ter ficado parada até que se compreendesse mais sobre as causas dos dois acidentes.

Reajuste das tarifas em 2020

As resseguradoras conseguiram grandes correções de preço nas renovações globais de aviação em janeiro de 2020, de acordo com a estudo da corretora Willis Re, apesar da abundância de capacidade disponível. Analistas relataram que as taxas de aviação aumentaram em média 15% para renovações sem acidentes e até 70% para renovações afetadas por perdas. Os eventos de perda da Ethiopian Airlines e da PT Lion Air resultaram em alta nas taxas de perda médias de longo prazo de 50% para entre 300% e 400%.

Acordo de US$ 2,5 bilhões

Em novembro de 2021, foi divulgado um acordo de US$ 2,5 bilhões para que a Boeing não respondesse a uma ação criminal nos EUA. O acordo inclui uma multa monetária criminal de US$ 243,6 milhões, pagamentos de compensação aos clientes da companhia aérea 737 MAX da Boeing de US$ 1,77 bilhão e o estabelecimento de um fundo de beneficiários de vítimas de acidentes de US$ 500 milhões para compensar os herdeiros, parentes e beneficiários legais dos passageiros.

D&O: US$ 237 milhões

Em novembro de 2021, os diretores da Boeing Co. concordaram com um acordo de US$ 237,5 milhões de alegações de que fecharam os olhos para questões de segurança relacionadas aos jatos 737 MAX. O acordo, pago por seguradoras que cobrem diretores e executivos da Boeing, foi entregue à empresa em vez de investidores descontentes que processaram as falhas de supervisão do conselho, de acordo com um documento no Delaware Chancery Court.

Na época do veredito, o juiz Morgan Zurn disse que os diretores perderam uma “bandeira vermelha” sobre os problemas de segurança do 737 MAX no primeiro acidente em outubro de 2018. O conselho não se moveu para obter maior supervisão sobre qualidade e segurança até que um segundo MAX mergulhou em um campo na Etiópia em março de 2019, segundo argumentação de fundos de pensão que processam a fabricante de aviões.

O acordo também exigiu que o conselho da Boeing tenha mais diretores com experiência em supervisão aeroespacial ou de segurança. A empresa concordou em adicionar um diretor com essa experiência e garantir que pelo menos três diretores tenham qualificação semelhante.

Compensação às vítimas passam a ser pedidos nos EUA

Em novembro de 2021, a Boeing chegou a um acordo com as famílias das vítimas do acidente de março de 2019. No acordo, a Boeing aceitou a responsabilidade pelo voo 302 da Ethiopian Airways perder o controle logo após a decolagem do Aeroporto Internacional de Addis Abeba Bole. Em seu acordo, a Boeing admitiu que seu software era o culpado pela perda de controle e destruição do ET 302, e que o 737-MAX estava em uma “condição insegura” para voar.

O acordo não envolve compensação monetária para as famílias, de acordo com registros do tribunal, mas permitiu que as famílias das vítimas busquem ações individuais nos tribunais dos EUA em vez de em seu país de origem, o que pode ser mais difícil. Isso significa que as indenizações podem alcançar um valor muito maior na terra do tio Sam, onde a industria de advogados consegue valores muito mais significativos do que em qualquer outra parte do mundo.

Países e regimes com o maior número de acidentes aéreos fatais de 1945 a 28 de fevereiro de 2022.

Fonte: Statista.com

Denise Bueno
Denise Buenohttp://www.sonhoseguro.com.br/
Denise Bueno sempre atuou na área de jornalismo econômico. Desde agosto de 2008 atua como jornalista freelancer, escrevendo matérias sobre finanças para cadernos especiais produzidos pelo jornal Valor Econômico, bem como para revistas como Época, Veja, Você S/A, Valor Financeiro, Valor 1000, Fiesp, ACSP, Revista de Seguros (CNSeg) entre outras publicações. É colunista do InfoMoney e do SindSeg-SP. Foi articulista da Revista Apólice. Escreveu artigos diariamente sobre seguros, resseguros, previdência e capitalização entre 1992 até agosto de 2008 para o jornal econômico Gazeta Mercantil. Recebeu, por 12 vezes, o prêmio de melhor jornalista de seguro em concursos diversos do setor e da grande mídia.

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