Para o professor Gustavo Robichez, inovação e empreendedorismo chineses podem ser mais inspiradores ao seguro brasileiro do que os modelos americano e europeu
Fonte: CNseg
O que é bom para China também pode ser bom também para o Brasil. Esta é a opinião do estudioso do país asiático Gustavo Robichez, professor da PUC-Rio, que apresentou a palestra “China: transformação digital e seus impactos econômicos e sociais”, nesta quinta-feira, 7 de novembro, no segundo e último dia do 4º Encontro de Inteligência de Mercado, evento promovido pela CNseg, em paralelo ao 13º Insurance Service Meeting, em São Paulo.
Robichez confessou que o seu interesse pela China foi despertado dois anos atrás, quando participou de evento da área de seguros e percebeu a predominância de empresas chinesas. “Fiquei curioso e passei a pesquisar”, disse. Desse trabalho de pesquisa, extraiu algumas visões que, a seu ver, refletem o atual momento da China. Uma delas é que o país tem se desenvolvido muito rápido e, prova disso, é Xangai, que experimento um intenso crescimento nos últimos 30 anos.
A segunda visão é que a China é extremamente monitorada por câmeras e sensores. “A sensação é de que se é vigiado 24 horas por dia”, disse. A terceira visão de Robichez também revela o avanço tecnológico do país, que adotou o QR Code como principal meio de pagamento e identificação. “Já dispensaram o papel-moeda e o cartão quase inexiste. O QR Code está presente em tudo”, disse.
De acordo com Robichez, a China tem realizado altos investimentos em tecnologias digitais e o resultado é que o país disputa a liderança com os Estados Unidos nessa área. Tanto que, em comparação com as empresas americanas, as chinesas estão na frente no uso e experimento de Inteligência Artificial nas áreas de consumo (80%, contra 40%); energia (82%, contra 78%); serviços financeiros (81% contra 43%); saúde (80% contra 43%).
Segundo o professor, o país asiático está amadurecendo o processo de uso de blockchain em exportações e no registro de dados. Outro avanço ocorre nas áreas de genética e biotecnologia. “Percebemos a China como uma potência econômica que lidera o avanço do conhecimento”, diz Robichez. Com base em seus estudos, ele conclui, ainda, que o país está desbravando novas fronteiras de aprendizado.
Em termos de assinantes da internet, a China conta com 394 milhões; a União Europeia, 176 milhões e Estados Unidos, 110 milhões. Na métrica “pagamentos móveis”, a China também está à frente, com 525 milhões de indivíduos, contra 45 milhões da UE e 55 milhões dos Estados Unidos, segundo dados do Center for Data Innovation 2019. Na interpretação de Robichez, a China acrescentou aos componentes de inovação (inteligência, capital, ecossistema, cultura e governo) outras variáveis, como escala, velocidade e visão de longo prazo.
Segundo o professor, no passado, a economia chinesa era impulsionada pela oferta. Com o desenvolvimento, a demanda dos consumidores passou a alavancar a economia. Nesse aspecto, ele fez um paralelo com o seguro brasileiro. “Temos espaço para mais produtos e temos de entender que os consumidores de seguros estão esperando isso”, disse.
Robichez observou que o ecossistema digital chinês é altamente integrado. Um exemplo é a gigante Alibaba, que em conjunto com empresas chinesas de outras áreas, passou a oferecer soluções integradas, incluindo produtos financeiros, de seguros, de saúde etc. Ele destacou, ainda, a experiência bem-sucedida do país em um novo produto de assistência no modelo crownfunding, que em sete meses de funcionamento alcançou 65 milhões de clientes.
O professor acredita que não deve demorar muito para a China desbancar alguns ícones consagrados do comércio eletrônico, como a Amazon, e assumir a liderança. Esta seria, então, a oportunidade para o Brasil se tornar parceiro nesse modelo. Robichez aposta que até 2021, 50% das organizações terão adotado tecnologia de alguma gigante chinesa dessa área. “A China está avançando em Inteligência Artificial. De janeiro para cá, já fecharam mais de 90 parcerias com países da Ásia que mantém relações com diversos outros países”, disse.
Para Robichez, o mercado de seguros brasileiro pode inovar e crescer se mirar no exemplo chinês de empreendedorismo. “Vale a pena ver por que os chineses são empreendedores e observar os erros deles. Sempre achamos que a solução dos nossos problemas virá dos Estados Unidos e da Europa, mas prestem atenção na China; eles são, sob certos aspectos, mais próximos do Brasil do que os norte-americanos ou europeus”, disse.
Investimentos chineses
O debatedor Tulio Cariello, coordenador de Análise e Pesquisa do Conselho Empresarial Brasil-China (CEBC), trouxe dados que revelam o quanto a China investe no Brasil e em que áreas. A entidade estuda o país asiático e foi reconhecida em 2015 e em 2019 como o principal fórum de debates entre os setores público e privado. Segundo Cariello, não é simples mensurar os investimentos chineses no Brasil, porque alguns são triangulares, passando por outras jurisdições antes de chegar no País. Por isso, o CEBC se baseia na mídia digital e em jornais para saber para onde estão indo os investimentos, que são confirmados com contatos posteriores com as empresas beneficiadas.
Segundo Cariello, a China anunciou investimentos de US$ 102 bilhões em 199 projetos no Brasil. Destes, o CEBC confirmou US$ 58 bilhões em 145 projetos. Entre 2017 e 2018, ele observou que houve uma queda nos investimentos na casa de 66%. “Com a troca de governo, os investidores chineses estavam cautelosos”, disse. De 2018 para cá, a China voltou a investir no Brasil. Em tecnologia, por exemplo, alcançou 16% dos investimentos destes US$ 102 bilhões.
O estado que recebe a maior parte dos recursos chineses é São Paulo. Cariello chamou a atenção para a presença de investimentos chineses em quase todo o país. Na América Latina, o Brasil é o destino preferencial, sobretudo na área de energia. Para o palestrante, falta ao Brasil um plano de longo prazo para receber esses investimentos. “As oportunidades estão ai, são uma realidade”, disse.
Como moderador do painel, Pedro Simões, analista da Superintendência de Estudos e Projetos da CNseg, concordou. “Precisamos enxergar a China. É muito importante olhá-la de uma maneira diferente, como protagonista”, disse.