A filosofia de solucionar problemas de Jayme e Bruno Garfinkel

A sucessão sempre foi um dos temores dos analistas que acompanham o desempenho da Porto Seguro na bolsa de valores e dos 36 mil corretores fiéis a marca e acostumados a apertar a mão de Jayme Garfinkel, 72 anos, sendo 47 deles a frente da companhia. De jeito calado, o herdeiro convence as pessoas a fazer o que tem em mente. Quando a conversa não rende o que quer, manda. Esse misto de respeito e firmeza criou um mito, dentro e fora do setor. 

Seu filho Bruno Garfinkel, 42 anos, depois de 15 anos na companhia, assume o comando do conselho de administração da maior seguradora de automóvel do Brasil, com desafios similares aos enfrentados por seu pai em 1978, quando tinha apenas 20 e poucos anos. “O Bruno, que passou os últimos dois anos como membro do conselho, tem mais sorte do que eu, que perdi meu pai de forma inesperada com 62 anos. Nem tive a chance de ser treinado por ele para a sucessão. Eu e minha mãe Rosa assumimos o comando e buscamos resolver todos os problemas com amor e dedicação. Quando se faz isso, dá certo”, comenta Jayme, ao blog Sonho Seguro. 

Os números do conglomerado e as recorrentes premiações de melhor seguradora segundo avaliação dos consumidores mostram ser esta uma filosofia vencedora. Jayme consta na lista da revista Forbes como um dos homens mais ricos do mundo por ter construído uma seguradora referência em qualidade de serviços prestados aos clientes. E isso só foi possível pela qualidade da força de vendas, o que é considerado pelos herdeiros como a jóia da coroa. Enquanto muitos apostam que a tecnologia vai acabar com os corretores de seguros, a Porto os prepara como consultores de riscos na oferta de uma infinidade de produtos criados e que a cada ano se tornam mais importantes no mix da companhia, como consórcios, financiamento, cartões, além de vários novos seguros, como PME, patrimonial, saúde, cibernéticos e responsabilidade civil.  

Apesar das diferenças macroeconômicas e setoriais entre a década de 70, quando se vendia seguro porta a porta, e os dias atuais, com ofertas na tela do smartphone, há similaridades, explica Bruno. Na década de 70, o seguro de automóvel era tido como um mau negócio, com margens apertadas e muito trabalhoso por exigir uma imensa estrutura operacional composta por atuários, vistoriadores, especialistas para gerenciar os pedidos de indenizações e canais de atendimento aos clientes e corretores. Além, é claro, de gestão de toda a cadeia de fornecedores, como oficinas, assistência 24 horas, leiloeiros entre outros.  Isso ainda se mantém e por isso afasta novos investidores que querem apostar suas fichas em novatas que surgem totalmente digitais.

“Hoje, se você pergunta quem quer entrar neste ramo, ninguém se manifesta. A principal semelhança é a vontade de trabalhar os problemas e nutrir a relação com nossos parceiros corretores. A atitude de enfrentar essas mudanças é o que preserva a companhia. Assim como Jayme criou soluções para reduzir a sinistralidade, com o brake light e descontos em estacionamentos, o que ajudou a ter um preço mais acessível ao cliente e um retorno interessante para manter o acionista no negócio, nos seguimos inovando com aplicativos para direção segura e tudo mais que a tecnologia nos permitir para tornar nosso negócio cada dia mais interessante para todos os elos da cadeia”, argumenta Bruno.

Algumas companhias optam por deixar de atuar no segmento pelas margens apertadas e pelas previsões futuras de que boa parte da população tem outras formas de mobilidade, como bicicletas, patinetes , transporte público e carros compartilhados. A outra parte que ainda optará por ter um carro deixará de comprar seguro pois o risco de batidas e roubos é considerado ínfimo diante da tecnologia embarcada. 

Tal cenário, desenhado por dezenas de consultorias, aponta para o crescimento do seguro de pessoas, com cobertura para responsabilidade civil para indenizar terceiros, e queda vertiginosa do seguro para reposição ou conserto do veículo em si, hoje responsável por mais de 75% das vendas do mercado segurador. Como gestora de risco, especialização inerente a uma seguradora, a Porto acompanha concorrentes e tendências e busca soluções. O seguro auto, que era o único ramo em que a companhia atuava em 1978, hoje representa 65% das receitas de quase R$ 18 bilhões obtidas em 2018, sendo R$ 15,5 bilhões com seguros. Consórcios, cartões de crédito, saúde e administração de recursos estão entre os negócios que apresentam evolução. Apesar de toda a gestão operacional do seguro ter sido facilitada pelo uso da tecnologia, a companhia emprega  15 mil funcionários. 

Comprou as carteiras de auto da Chubb e da AXA no passado, para aumentar a escala e otimizar custos. O grupo também investe para aumentar a participação de outros produtos no mix da companhia, como saúde, PME e produtos financeiros. Neste ano anunciou parceria com a AIG para a venda de seguros financeiros e assumiu a carteira da americana Travelers, que deixará o país. 

“O mundo mudou muito. O Bruno está muito mais preparado do que eu para desbravar essa nova economia digital”, afirma Jayme. As mudanças são do tamanho dos desafios, que só aumentam. Certamente quem já estava acostumado a ter o cliente no centro da estratégia de negócios, sente bem menos do que outros que passaram a adotar isso como lema recentemente. As ações da companhia se mantiveram estáveis após o anúncio da sucessão no início desta semana. Os corretores e clientes se manifestaram apenas para desejar sucesso aos dois, que já conhecem de longa data. Amanhã, dia 3, a seguradora divulga o balanço do trimestre, sem qualquer ansiedade dos jornalistas. Ou seja, vida que segue, num mercado que se torna mais dinâmico, mas mantém a boa fé como principio básico para a sua existência e longevidade.

Denise Bueno
Denise Buenohttp://www.sonhoseguro.com.br/
Denise Bueno sempre atuou na área de jornalismo econômico. Desde agosto de 2008 atua como jornalista freelancer, escrevendo matérias sobre finanças para cadernos especiais produzidos pelo jornal Valor Econômico, bem como para revistas como Época, Veja, Você S/A, Valor Financeiro, Valor 1000, Fiesp, ACSP, Revista de Seguros (CNSeg) entre outras publicações. É colunista do InfoMoney e do SindSeg-SP. Foi articulista da Revista Apólice. Escreveu artigos diariamente sobre seguros, resseguros, previdência e capitalização entre 1992 até agosto de 2008 para o jornal econômico Gazeta Mercantil. Recebeu, por 12 vezes, o prêmio de melhor jornalista de seguro em concursos diversos do setor e da grande mídia.

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