Joaquim Barbosa: Políticos querem se perpetuar nos cargos e os empreendedores tirar a concorrência do caminho

Barbosa: a corrupção tem como base uma sociedade desigual, trocas de favores na esfera pública e a promiscuidade
Barbosa: a corrupção tem como base uma sociedade desigual, trocas de favores na esfera pública e a promiscuidade
Fonte: CQCS

O convidado mais esperado da noite de abertura do 19º Congresso dos Corretores foi o ex-ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Joaquim Barbosa. Os corretores estavam ansiosos para ouvir o magistrado. Ao ter seu nome anunciado no centro de convenções do Rafain Palace Hotel onde está acontecendo o congresso em Foz do Iguaçu, os corretores aplaudiram efusivamente. Quando Barbosa apareceu no palco, os corretores passaram a aplaudir o magistrado em pé aos gritos de “Candidato a presidente!”.

Como que falando para uma plateia de alunos atentos, Barbosa falou didaticamente sobre “instituições brasileiras em tempo de crise”. Ele fez sua leitura sobre como a política brasileira se encaminhou para o estado atual e traçou um raciocínio baseado no direito à propriedade. “Em época de crise econômica há o risco de governantes inescrupulosos investirem contra o direito à propriedade privada para se manterem no poder”, disse.

Ele explicou que na democracia o Poder Judiciário garante aos cidadãos o direito dos indivíduos. Para o jurista, a corrupção tem como base uma sociedade desigual, trocas de favores na esfera pública e a “promiscuidade” que estão na raiz da relação entre a política e o poder econômico. O direito à privacidade está previsto na Constituição de 88. Barbosa disse que governantes inaptos podem tentar ingerir nesse campo e lembrou que o STF já analisou questões em áreas sensíveis no campo de escolhas individuais, como células-tronco, aborto por anencefalia, homoafetividade. “Em momentos de crise, o judiciário não tenderia a falhar e optar pelo estado em questões de garantir os direitos do cidadão?”, questionou.

Para ele a corrupção sistêmica é causada pela mescla entre empreendedorismo econômico e, ao mesmo tempo, recebimento de vantagens financeiras da parte do Estado. “A dependência excessiva de benefícios empresariais concedidos pelo Estado corrompe completamente a lógica do sistema público capitalista”, explicou.

O ex-presidente do STF lembrou que políticos naturalmente querem se eleger e se perpetuar nos cargos para os quais são eleitos. “Já os empreendedores, nessa relação promíscua, com esse tipo de financiamento, querem subsídios que os ajudem a tirar a concorrência do seu caminho”, destacou.

Barbosa explicou aos corretores que no sistema presidencialista, a Constituição prevê um sistema judiciário independente, guardiã dos direitos fundamentais do cidadão. “Os membros do judiciário têm algumas prerrogativas como o poder de elaborar seus próprios orçamentos; o juiz só não é independente se não quiser”, destacou.

Ele destacou que em ambientes em que as instituições não funcionam, as pessoas não agem com honestidade e os agentes públicos são vistos com desconfiança. “O jeitinho brasileiro é um entorse ao funcionamento das instituições, é uma forma de burlar a lei”, disse. Ele questionou se as empresas temeriam retaliação caso a ética fosse adotada como norte em alguns negócios. “Nenhum sistema jurídico tem como impedir a proliferação de um ambiente de desvio. O sistema jurídico não foi feito para reprimir violações de direitos”, assegurou. A eficiência, segundo Barbosa, está na rapidez com que as instituições detectam e corrigem os abusos.

Para ele o país tem vícios da colonização enraizados em suas instituições. “Há no sistema econômico uma excessiva dependência de auxílio do estado; o corporativismo de alguns poucos provoca distorções”, disse. Algumas empresas foram criadas para suprir necessidades, cresceram com vícios. Barbosa explicou que de acordo com a constituição quando o estado cria uma empresa para atuar em determinada área, ela deve atuar em igualdade jurídica com as empresas privadas.

Ao se tornarem dependentes do estado, algumas empresas são estimuladas a se aproximar do governo em busca de privilégios. “O capitalismo de estado é um capitalismo quebrado. Uma sociedade que se paute pelo capitalismo de estado crê que a desigualdade é algo normal”, afirmou.

Barbosa explicou que mecanismos institucionais servem para manter privilégios contrários aos defendidos pela Constituição e o poder judiciário, infelizmente, falhou em alguns momentos. “É irreal esperar 100% de eficiência das instituições políticas, cabe aos cidadãos cobrar as situações de rumo quando detectar desvios”. Ele salientou ainda que a sociedade brasileira emite sinais confusos. “Somos afáveis, mas uma parcela dos cidadãos demonstra insensibilidade para fenômenos como violência, brutalidade policial, linchamentos, grupos de extermínio, nós elegemos e nos deixamos enganar, com rara frequência, por políticos desonestos”, criticou.

Para ele, essa crise na sociedade levou o brasileiro a um grau extremado de falta de confiança como raramente se viu. “Vemos a desmoralização partidária e de políticos profissionais. Os partidos e seus dirigentes têm a sua disposição o dinheiro do fundo partidário que é distribuído de acordo com o tamanho das bancadas, mas eles querem mais, querem dar continuidade à relação de promiscuidades as empresas que prestam serviço aos diversos governos, querem dar curso a essa relação de extorsão”, destacou.

Chegando ao fim de sua exposição, Barbosa disse que a crise da instituição da presidência da República é o centro de gravidade. “Quando faltam qualidades ao presidente, a instituição entra em crise. Se há vácuo na política, ele é ocupado por aventureiros e lamentavelmente essa é a situação do Brasil”. Para Barbosa a solução é que o cidadão assuma sua responsabilidade: “É preciso que o cidadão se conscientize que a solução está em suas mãos e não de grupos oportunistas que nada mais querem se não dar continuidade a uma situação já existente”, finalizou.

Denise Bueno
Denise Buenohttp://www.sonhoseguro.com.br/
Denise Bueno sempre atuou na área de jornalismo econômico. Desde agosto de 2008 atua como jornalista freelancer, escrevendo matérias sobre finanças para cadernos especiais produzidos pelo jornal Valor Econômico, bem como para revistas como Época, Veja, Você S/A, Valor Financeiro, Valor 1000, Fiesp, ACSP, Revista de Seguros (CNSeg) entre outras publicações. É colunista do InfoMoney e do SindSeg-SP. Foi articulista da Revista Apólice. Escreveu artigos diariamente sobre seguros, resseguros, previdência e capitalização entre 1992 até agosto de 2008 para o jornal econômico Gazeta Mercantil. Recebeu, por 12 vezes, o prêmio de melhor jornalista de seguro em concursos diversos do setor e da grande mídia.

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