Velhas e novas lições para players do mercado de Garantia

Uma radiografia do ramo Garantia exibirá, primeiramente, uma carteira musculosa- arrecada R$ 800 milhões por ano- capaz de chamar a atenção do mercado, a ponto de aumentar o número de players nos últimos anos. Mas exames mais sofisticados vão apontar também as primeiras “dores do crescimento” dessa jovem modalidade. A começar da própria receita, estabilizada nos últimos anos, e de um acelerado avanço da sinistralidade. Enquanto a receita segue na casa de R$ 800 milhões, a sinistralidade, considerando-se a média móvel de 12 meses, pulou de R$ 100 milhões (valores de 2002) para R$ 600 milhões em janeiro deste ano.

Mas, em vez de um freio de arrumação, as políticas comerciais tornam-se mais agressivas e até arriscadas numa modalidade que não “é para amadores, já que pequenos deslizes na subscrição e na tarifação podem significar a vida ou morte da seguradora”, adverte o executivo Rogério Vergara, diretor executivo do grupo BB e Mafpre Seguros S/A e um dos autores das três palestras técnicas (“Legislação e clausulado”) sobre o seguro Garantia apresentadas no 2º Encontro de Resseguro, realizado no Rio de Janeiro. Os três painéis sobre o Garantia foram moderados por José Américo Peón de Sá, assessor de Desenvolvimento Relacional da CNseg, que promove o encontro de dois dias (encerra-se nesta quinta-feira) ao lado da Abecor-RE, Fenaber e Escola Nacional de Seguros.

Porém, o apetite por riscos é inequívoco- até porque as seguradoras de Garantia precisam obter fatias crescentes de um bolo que não cresce nos últimos anos, e o mercado recorre à queda da tarifação, a aumentos das comissões e a políticas de subscrição mais flexíveis para emitir mais rapidamente as apólices, ignorando, porém, a plenitude dos riscos assumidos, adverte Vergara. “O seguro garantia é um contrato acessório, porque é oriundo de um contrato principal, que pode ter até 150 páginas em alguns casos e precisa ser examinado com toda a atenção”, afirma ele.

O fato que a dor do crescimento ainda bem suportável, sobretudo porque o mercado de Garantia ainda conta com um colchão importante para amenizar prejuízos. Ou seja, tem a parceria das resseguradoras, também ávidas por captar negócios neste nicho, o que, na hora do sinistro, pulveriza as perdas. “A sinistralidade efetivamente subiu, mas um olhar atento para os sinistros retidos indicará que ela não está concentrada nas seguradoras, mas sim nas resseguradoras”, comenta o executivo Carlos Frederico Ferreira, diretor técnico da Austral Seguros e outro palestrante (“Sinistros Complexos-Garantia”) do encontro.

Isso ocorre porque o mercado do Seguro Garantia é conhecido pela baixa frequência de sinistros, mas alta severidade, exigindo grande participação de resseguradoras. Além disso, os limites de importância segurada do Garantia têm percentuais reduzidos em relação aos valores das licitações públicas para contratação de obras, serviços e compras. Dependendo da modalidade de contrato de Garantia, os limites de coberturas oscilam de 1% a 10%.

Os especialistas, incluindo-se aí Gladimir Poletto (advogado da Poletto Advogados) e Cristina Muelas (consultora do IRB-Brasil Re)- eles participaram do painel “Garantia Judicial”)-, estão convictos de que a demanda de produtos desse ramo ainda vai evoluir significativamente. O próprio Garantia Judicial é um bom exemplo disso. Com demanda crescente no mercado e aceito pelos tribunais de primeira e segunda instâncias, o produto substitui a penhora ou depósito de valores para viabilizar o prosseguimento da ação judicial.

Mas o seguro ainda enfrenta resistências pelos ministros do Superior Tribunal de Justiça (STJ), dependendo da matéria- cível, tributária ou trabalhista- porque seu entendimento ainda é tradicionalista, assegura Gladimir. Mas uma hora o vento muda, até porque há boa acolhida nos tribunais inferiores e demanda crescente da sociedade, prevê o especialista.

Olhando para o futuro, a perspectiva é promissora para as diversas modalidades reunidas no ramo Garantia. Não só porque há o interesse do governo em aprovar aumentos dos limites de coberturas do Garantia, podendo chegar subir de 10% para 45% nas chamadas obras complexas, aproximando-se, dessa forma, das alíquotas de mercados mais evoluídos, como a Europa, na casa de 30%, e nos Estados Unidos, na faixa de 100% dos valores licitados.

Confirmando-se isso, o mercado vai não só arrecadar mais prêmios, mas assumir crescentes responsabilidades. Não poderá, como por ora, cometer qualquer deslize em termos de preços, comissões e subscrição, certamente.

Denise Bueno
Denise Buenohttp://www.sonhoseguro.com.br/
Denise Bueno sempre atuou na área de jornalismo econômico. Desde agosto de 2008 atua como jornalista freelancer, escrevendo matérias sobre finanças para cadernos especiais produzidos pelo jornal Valor Econômico, bem como para revistas como Época, Veja, Você S/A, Valor Financeiro, Valor 1000, Fiesp, ACSP, Revista de Seguros (CNSeg) entre outras publicações. É colunista do InfoMoney e do SindSeg-SP. Foi articulista da Revista Apólice. Escreveu artigos diariamente sobre seguros, resseguros, previdência e capitalização entre 1992 até agosto de 2008 para o jornal econômico Gazeta Mercantil. Recebeu, por 12 vezes, o prêmio de melhor jornalista de seguro em concursos diversos do setor e da grande mídia.

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