*artigo produzido com exclusividade para a Revista Apólice. A jornalista viajou para Alemanha a convite da Allianz e para Suíça por indicação da SulAmérica.
As seguradoras não podem ser penalizadas com uma regulamentação mais rígida porque as perdas financeiras geradas pelas crises nos mercados mundiais foram e estão concentradas nos bancos. Este tema, juntamente com os indicadores macroeconômicos, efetivamente a inflação em países com crescimento e a deflação em regiões em recessão, são as duas grandes preocupações dos líderes mundiais de seguros, segundo pesquisa divulgada pela Geneva Association, entidade fundada em 1973 e que reúne 80 CEOs da indústria de seguros global.
A regulamentação poderá gerar um engessamento do setor e aumento dos custos para os segurados. Já os indicadores macroeconômicos voláteis inibem os investimentos e retardam o crescimento do setor, afirmam os executivos que participaram da pesquisa que balizará os estudos da associação para os próximos anos. Os órgãos reguladores mundiais têm sinalizado uma forte tendência de criar normas únicas para o sistema financeiro, englobando todas as operações do conglomerado internacional.
O objetivo dos governos é evitar que um dos nichos de atuação de determinada instituição não cause estrago em diversas empresas e mercados como aconteceu, por exemplo, com a AIG. A maior seguradora do mundo até setembro de 2008 só não foi à falência porque o governo americano disponibilizou uma linha de crédito de US$ 180 bilhões para evitar um efeito cascata. O estrago foi causado principalmente por uma pequena linha de negócios financeiros, responsável por prêmios de US$ 2 bilhões por ano. Nada, considerando-se o faturamento global superior a US$ 100 bilhões.
As perdas atreladas ao mercado de seguros foram pontuais em algumas companhias que atuavam com seguros financeiros ligados às garantias de hipotecas de alto risco, conhecido como subprime. De acordo com o estudo, o socorro dos governos aos bancos entre setembro de 2008 e fevereiro de 2010 totalizou US$ 1,5 trilhão. Já para as seguradoras, o volume chegou a US$ 170 bilhões, sendo praticamente quase a totalidade para apenas uma seguradora, a AIG.
“A crise mostrou que as seguradoras e resseguradoras não representam um risco sistêmico. Foram afetadas, as não foram a causa do problema. Por isso não podem ser penalizadas pela má gestão de riscos dos bancos”, afirma Nikolaus von Bomhard, presidente do Conselho da Geneva Association e da Munich Re, maior resseguradora do mundo, a um grupo de jornalistas, durante almoço promovido pela entidade no dia 3 de junho em um dos prédios da Swiss Re, localizado nas montanhas suíças.
Michael Diekmann, também membro do conselho e presidente mundial da Allianz, que se tornou a maior seguradora do mundo com a derrocada da AIG, diz que a regulamentação do mercado financeiro deve realmente ser rígida e global, mas não se pode colocar tudo debaixo do mesmo “guarda chuva”. “A indústria de seguros tem regras rígidas, que serão ainda mais severas com a implementação das normas de Solvência II previstas para o final de 2012”, garante.
Nos EUA, por exemplo, recentemente o Governo divulgou as novas regras para instituições financeiras. Em seguros, a novidade ficou por conta da criação de um regulador nacional, como vinham solicitando há tempos as seguradoras nacionais e globais. Até então, as regulamentações variavam de estado para estado, o que dificultava e onerava, inclusive, o sistema de gestão de riscos e de contabilidade dos grupos.
Patrick Larragoiti (foto), da SulAmérica e único brasileiro a fazer parte do conselho da Geneva Association, explica que uma das lutas da associação é mostrar aos orgãos reguladores que manter a atividade de seguro regulada por uma entidade especializada traz mais segurança ao sistema do que ter a indústria controlada por uma autoridade monetária preocupada com bancos, fundos e mercado acionário.
“No Brasil temos a Superintendência de Seguros Privados (Susep) com a elevada influência do Banco Central. Há grande conexão, inclusive de profissionais entre os dois órgãos”, diz, enfatizando que o setor não sofreu qualquer perda com a crise. “Pelo contrário. Continuamos nosso ritmo de crescimento”. Ninguém discorda de que novas regras de solvência são necessárias. E as normas podem ser rígidas. “Desde que sejam corretas, levando-se em conta as peculiaridades do setor de seguro”, enfatiza Bomhard. Os executivos querem evitar a inclusão do setor no pagamento de taxas as quais o setor bancário deverá ser tributado.
Stefan Lippe, presidente da Swiss Re e membro do conselho, reforça a opinião de seus colegas. “A indústria de seguros funciona como um amortecedor para crises ao gerenciar riscos e pagar indenizações”, diz. A segunda maior resseguradora do mundo precisou de um reforço de caixa para fazer frente às suas obrigações contratuais e nível de solvência exigido pela regulamentação. Isto se traduziu em um empréstimo ponte de US$ 2,6 bilhões fornecido pela Berkshire Hathway, controlada pelo megainvestidor Warren Buffett, já totalmente quitado.
As novas regras do mercado de seguros na Europa, conhecidas como Solvência II, deverão ser definidas até 2012 para começarem a valer em 2013. São essas regras que definirão quanto de capital as companhias terão de ter para garantir os contratos assumidos. Estudos já divulgados afirmam que as grandes companhias praticamente não serão afetadas. Já as médias e pequenas terão de reformular suas estratégias. Há quatro caminhos básicos para ajustar-se aos novos padrões de solvência: alocar capital, reduzir as vendas, comprar resseguro ou iniciar um processo de fusão e aquisição.
“Dependemos da definição das regras para podermos ter uma noção mais clara de como investir nossos recursos”, comenta o presidente da Allianz, grupo mundial formado pela aquisição de mais de uma centena de companhias. Entre as grandes aquisições podemos citar a AGF.
É tido como certo de que os principais países do mundo, inclusive o Brasil, adotarão este normativo como um padrão internacional. “Vivemos um momento totalmente diferente. Estamos em pleno crescimento e com padrões contábeis internacionais sendo regulamentados”, avalia Marco Antonio Rossi, presidente da Bradesco Seguros e Previdência, que participa do grupo de CEOs da Geneva Association e acompanhou a reunião anual da entidade realizada entre os dias 2 e 5 de junho, no Centro de Estudos da Swiss Re.
Para os membros do conselho da Geneva Association, que representam praticamente 80% do PIB mundial de seguros, a melhor solução para garantir o direito dos consumidores e manter a indústria saudável em termos de preços, coberturas e serviços, é a adoção da Solvência II e órgãos reguladores independentes. “Nós temos confiança absoluta de que Solvência II é o caminho certo a ser seguido pelos órgãos reguladores de todo o mundo, criando assim uma competição saudável em uma indústria globalizada”, afirmam Bomhard e Diekmann, ambos CEOs de grupos presentes em mais de 100 países.