Finalmente os opostos se atraíram. Jayme Garfinkel, um apaixonado por seguro, e Roberto Setubal, conhecido na indústria de seguros por sua aversão ao produto, anunciaram ontem a criação da maior seguradora de automóvel e de residência do Brasil: Porto Seguro Itaú Unibanco Participações (Psiupar).
Há anos (muitos mesmo, mais de 15), escuto opiniões de seguradores, analistas, consultores, corretores, consumidores sobre os mais diversos assuntos da indústria de seguros do Brasil e do mundo. Alguns me despertam mais a curiosidade.
Em automóvel, um assunto que sempre chamava a minha atenção, era a resistência de Jayme Garfinkel, presidente da Porto Seguro, a maior seguradora de automóvel do Brasil, em ter um sócio estrangeiro ou mesmo abrir o capital da seguradora. Uma história, verdadeira ou não, que ilustra o comportamento de Jayme, foi uma conversa que teve com sua mãe, dona Rosa, sobre o assunto. Segundo contam pessoas próximas à família, ao pronunciar a frase “mãe estava pensando em ter um sócio na Porto”, dona Rosa rapidamente respondeu com uma pergunta: “mas meu filho, por que você não disse que estava precisando de dinheiro?”.
Tais alternativas eram consideradas pelos especialistas um caminho natural para poder otimizar o crescimento da companhia diante de um cenário promissor para a indústria de seguros no Brasil, que chamava a atenção do mundo pela discrepância de um indicador. Nas economias maduras há um paralelismo entre o tamanho da economia e o da indústria de seguros. No Brasil há uma vala. Temos a décima maior economia do mundo e somos o 19º maior mercado de seguros.
Enquanto Jayme pensava, os estrangeiros investiam em parcerias ou na carreira solo no Brasil. Jayme ficou quase uma década conversando com estrangeiros, sem conseguir se convencer de que este era o caminho do sucesso. Muitos dos estrangeiros que vieram desistiram do Brasil, inclusive a francesa AXA, cuja carteira de automóvel foi comprada pela Porto e deu origem a Azul.
Quando Garfinkel decidiu abrir o capital da Porto foi atropelado pelas crises econômicas da década de 90. Foi só quatro anos depois, em novembro de 2004, que a Porto fez o primeiro IPO. E o fez mais para resolver o impasse com familiares, que queriam vender a participação que tinham, do que para capitalizar a seguradora. A abertura colocou a Porto em destaque, ao ser a única seguradora a ingressar no mais alto nível de governança corporativa do mercado acionário.
Outra atitude que me aguçava o interesse era a antipatia com que Roberto Setubal, presidente do Itaú, um banco sustentável, tratava o assunto seguro, mesmo diante de um cenário tão promissor traçado por analistas financeiros e tendo um potencial de vendas fantástico, uma vez que menos de 10% dos clientes do banco tinham um seguro de carro com a seguradora do grupo. Seu concorrente Bradesco, por exemplo, tem 35% do lucro do banco proveniente das operações das seguradoras, principalmente da área de vida e previdência. No Itaú esta relação não chega a 10%.
O pai, Olavo Setubal, falecido em agosto do ano passado, nutria simpatia pela indústria de seguros. Tanto que em 1921 foi fundada a Companhia Ítalo-Brasileira de Seguros Geraes, uma das pedras fundamentais do Grupo Itaúsa. Todos os envolvidos com seguro tentavam mostrar o lado bom de seguros para Setubal. Até mesmo com a hipótese de venda da operação. Muitas foram as conversas no passado, inclusive com a Porto e com estrangeiras. Mas nada, o que me deixava mais curiosa e atenta em relação ao mercado de seguros.
Uns diziam que as perdas com o Hospitaú – um seguro saúde ótimo para o cliente e caríssimo para a seguradora – pareciam que jamais seriam esquecidas. Além do mau negócio com seguro saúde, Setubal não queria correr o risco de perder um cliente do banco por ter sido mal atendido pelos serviços da seguradora, comentavam os mais experientes.
Mas o argumento mais convincente vinha das contas matemáticas. Banqueiros do mundo todo argumentam que ganham mais disponibilizando o canal bancário para uma seguradora especializada, que chegam a pagar comissão de até 30% das vendas para remunerar o balcão de vendas. E isso sem ter de correr o risco de garantir o pagamento de indenizações em caso de acidentes e livres de administrar funcionários, corretores, oficinas mecânicas, rede de prestadores de serviços entre outros.
Para as seguradoras independentes, ter um canal de distribuição para produtos massificados é praticamente uma questão de sobrevivência, principalmente quando os maiores bancos do país afirmam que a área de seguros passou a ser uma prioridade para compensar a queda da rentabilidade.
Bem, depois de tantos anos, com mudanças na regulamentação do setor, adoção de critérios internacionais como Solvência II, criação de código de éticas das seguradoras, reformulação de produtos e serviços e aumento do poder aquisitivo da população, Roberto Setubal passou a apoiar algumas ações. Autorizou a criação de uma seguradora de grandes riscos em parceria com o grupo XL Capital, das Bermudas, formando a Itaú XL Seguros Corporativos. Também anunciou a abertura de uma seguradora de vida no Chile.
E agora, com o seguro próximo de chegar a 4% do PIB, o dobro da participação que tinha há 15 anos, indicadores macroeconômicos estáveis e o Brasil sendo um país considerado seguro para investimentos pelas agências de rating, Garfinkel e Setubal finalmente se encontraram com estratégias opostas no que diz respeito a seguro. Um precisa ter escala em seguro para manter o interesse dos acionistas no negócio. O outro necessita maximizar o ganho do banco e assim partir para a internacionalização com mais “gás” para enfrentar concorrentes de peso.
A combinação perfeita, principalmente se levarmos em conta a semelhança no jeito de ser. Ambos são herdeiros e por apostarem em atitudes sustentáveis tornaram suas empresas líderes nos segmentos em que atuam. Afinal, é preciso ter amor pelo que faz para fazer bem feito. O lucro, vital para reinvestir no negócio, é uma consequência da boa gestão. A quantidade é importante, desde que inseparável da qualidade. Assim, tanto Garfinkel como Setubal, mesmo sem focar a liderança, se tornaram líderes. A nova seguradora é líder disparada do segmento de automóvel, com 28% das vendas do primeiro semestre. Praticamente o dobro do segundo colocado.
Por isso, analistas acreditam que Garfinkel e Setubal fecharam um dos maiores negócios da indústria de seguros, que servirá para ilustrar, como um caso de sucesso, a história de um novo mercado de seguro no País. O mais famoso até ontem, em termos de estratégia, volume financeiro e sucesso da parceria era a associação do Unibanco com a AIG, em 1996.
A similaridade aqui é que José Rudge, hoje vice-presidente do Itaú Unibanco, esteve à frente das duas negociações. Outro grande negócio deverá ser anunciado em breve pelo Banco do Brasil, envolvido em uma verdadeira engenharia financeira há quase dois anos para ser um dos maiores neste segmento.
Vapt vupt – O curioso foi a forma como os executivos contaram a negociação. Para um desatento, parece que foi por acaso. Segundo eles, a Porto negociava há meses com o Bradesco, que a cortejava desde meados dos anos 90. No dia 30 de junho deste ano, a Porto precisou fazer um comunicado à CVM pois a notícia havia vazado. Explicou em nota que mantinha conversas, mas não envolvia o controle da companhia.
Um dia, enquanto almoçava com sua mãe, Garfinkel foi procurado pela jornalista da revista Época, dizendo o que todos comentavam. Havia boatos de que o Bradesco havia dito que as negociações com a Porto estavam difíceis. Aparentemente, ambos queriam o controle, o que estaria emperrando a negociação.
Magoado pela forma com que o assunto estava sendo tratado, com o vazamento de informações, Garfinkel ligou na manhã seguinte, dia 14 de agosto, para o Itaú. Em nove dias fecharam um acordo. Possível? “A Porto Seguro tem tradição, reputação, marca e performance invejável. Temos confiança na parceria que estamos criando, por isso fizemos em velocidade recorde”, afirma Pedro Moreira Salles, presidente do Conselho do Itaú Unibanco.
Não querer ter o controle da operação e o ranking não ser uma prioridade de Setubal facilitaram as conversas. “Em ranking, não temos a liderança porque o controle da operação é da Porto e por isso não podemos consolidar os números”, comentou tranqüilamente Setubal durante a coletiva de imprensa.
Mas quando o assunto é rentabilidade…”Estou noites sem dormir para negociar a criação desta nova empresa. Agora ficarei muitas outras para ajudar a colocar a empresa em operação e conseguir o lucro que eles esperam que a seguradora apresente”, disse Garfinkel, para quem “o sucesso de um negócio depende de trabalho, inteligência e sorte. Como sorte e inteligência a gente não controla, o negócio é trabalhar muito”, acrescentou o herdeiro da Porto Seguro.
Líder de mercado – A Psiupar, a mais nova seguradora da indústria de seguros, será formada por uma troca de papeis entre Porto Seguro e Itaú Unibanco, num negócio avaliado em R$ 1,7 bilhão, segundo informou Setubal. A Psiupar nasce com a transferência das carteiras de seguro automóvel e de residência do Itaú Unibanco para a Porto, com a transferência do patrimônio líquido consolidado de R$ 3,050 bilhão (R$ 950 milhões do Itaú e R$ 2,1 bilhão da Porto).
Em prêmios, a nova empresa passa a ter R$ 2,32 bilhões em veículos e de R$ 198 milhões em residências. Em clientes são 3,4 milhões de automóveis (1.250 do Itaú e 2.150 da Porto) e 1,2 milhão de residências seguradas (810 do Itaú e 425 da Porto). O Itaú Unibanco vai deter 43% da Psiupar e os controladores da Porto 57%. A nova empresa, por sua vez, deterá 70% da Porto Seguro SA e os 30% restante ficarão no mercado.
A nova seguradora agradou o mercado. As ações da Porto Seguro apresentaram alta de quase 10% ontem e as do banco Itaú Unibanco evoluíram quase 1%. A Psiupar será gerida pela Porto Seguro e venderá, no Brasil e no Uruguai, três marcas: Porto Seguro, Itaú Unibanco e Azul. Por deter exclusividade na venda de produtos residenciais e de automóvel nas agências do banco, a Psiupar pretende oferecer produtos diferenciados para agradar todos os segmentos de clientes do Itaú Unibanco, desde o mais rico até o de menor renda.
Segundo os executivos, nada muda para os clientes, com as apólices e os serviços já contratados vigorando normalmente. Os funcionários do Itaú Unibanco que fazem parte da operação serão transferidos para a nova empresa, que ocupará o espaço onde estava o Unibanco, no prédio da avenida Eusébio Matoso. Neste local está concentrada toda a operação de seguros do segundo maior banco do Brasil por ativos. “Pretendemos fazer como fizemos na Azul, respeitando a identidade do negócio. Por isso, funcionários, clientes e corretores não precisam se preocupar”, disse Garfinkel.
Uma das preocupações do grupo era com os corretores, sempre avessos a concorrência das vendas pelo canal bancário. “O Itaú já tinha um bom relacionamento com os corretores, assim como o Unibanco. Agora quem vai pilotar isso é o Jayme”, disse Setubal, apostando no sucesso, uma vez que a Porto Seguro desenvolveu sua liderança com base no relacionamento com o seu maior canal de vendas. São cerca de 20 mil corretores de seguros cadastrados na maior seguradora de carro do Brasil.
XL em discussão – Segundo Roberto Setubal, a associação começou com automóvel e residência, mas pode se estender para outros produtos. Em grandes riscos, a atuação do Itaú Unibanco está sendo rediscutida. O Itaú tem uma joint venture com a XL na Itaú XL Seguros Corporativos. Com a fusão com o Unibanco, comprou a participação da AIG na Unibanco AIG Seguros. Ficou com a maior operação de grandes riscos da indústria de seguros. “Estamos rediscutindo com a XL o negócio, mas não pretendemos sair da operação de grandes riscos”. Os segmentos de Previdência e Vida, bem como as operações de títulos de capitalização, permanecem sem alterações.
Concorrência – A conclusão da operação depende de aprovação dos acionistas, da Superintendência de Seguros Privados (Susep) e do Sistema Brasileiro de Defesa de Concorrência (SBDC). Setubal está tranqüilo quanto a aprovação, uma vez que a concorrência existe com a oferta de três marcas e os produtos em questão, auto e casa, são pulverizados no mercado.
No entanto, as seguradoras sem canal bancário com certeza perderão noites de sono para descobrir uma fórmula de sobreviver a este novo cenário do seguro automóvel no Brasil dominado pelas seguradoras ligadas a bancos. “Assim como eu, todos vão perder noites de sono”, comentou Garfinkel, referindo-se a tendência mundial de bancassurance (vendas de seguros nas agências bancárias).
Este era um encontro que já estava marcado. A parceria era apenas uma questão de tempo. O encontro do Bradesco pode estar com alguma seguradora de A a Z, bem como o da Caixa Econômica Federal, do Banco do Brasil e do Santander. Entre os acordos mais recentes temos Liberty com Indiana, Yasuda com Maritima, e Zurich com Minas Brasil.
A disputa nos canais bancários por seguros patrimoniais envolve, oficialmente, a espanhola Mapfre e a SulAmérica. Nas duas o segmento de automóvel representa no mínimo 40% das vendas totais. Há até quem fale na volta da parceria desenhada na decada de 80 entre SulAmérica e Bradesco. Quem imagina que a concorrência está no limite, preste atenção ao que diz o tio de Garfinkel, segundo ele um simples filósofo de Atibaia: “Tudo pode piorar”.
Segundo os especialistas, ainda serão anunciadas muitas outras operações envolvendo fusões e aquisições na indústria de seguros, principalmente quando as regras de exigência de capital baseado em risco forem estendidas às operações de previdência privada. O que já está sendo discutido pela Susep.
como corretor, gostaria muito de vender o seguro saude da porto, mas para isso, precisa ser competitivo, reduzir de 20 vidas para 3, 4, ou 5 vidas.
o chamado pme hoje, da muito lucro, basta a porto analisar esse filao e voltar a comercializar.
na apolice pme, a seguradora nunca perde, visto que existe a clausula de sinistralidade.
abcs,
jair. 11-97154500.