Petrobras investe em gerenciar riscos

images8A quarta maior petrolífera em valor de mercado do mundo tem clara noção da importância do gerenciamento de risco em sua atividade. Com investimentos superiores a US$ 30 milhões por ano em um programa de seguro para os bens patrimoniais e outros milhões para garantir mais de US$ 120 bilhões em investimentos previstos para os próximos anos, a Petrobras tem uma equipe de 70 funcionários para mitigar riscos e preservar o patrimônio de seus acionistas. Acompanhe os principais trechos da entrevista concedida por Jorge José Nahas Neto, Gerente Executivo de Planejamento Financeiro e Gestão de Riscos à jornalista Denise Bueno para a revista Gerencia de Riscos e Seguros, do grupo Mapfre.

Desde quando existe a unidade de gerenciamento de risco da Petrobras?
A unidade corporativa, responsável pela administração dos riscos da companhia, foi criada em 1999. Na época, a diretoria executiva já tinha consciência do aumento da exposição aos fatores de risco que a abertura do mercado doméstico do setor iria promover. Mas, mesmo antes da criação da unidade corporativa, já existia uma unidade de gestão de riscos na área comercial, para tratar riscos de preços de petróleo e derivados nas transações comerciais no exterior e uma unidade específica de seguros dentro da área financeira.

A quem se reporta a gerência de riscos?
Ao Diretor Financeiro.

Quantos empregados fazem parte da sua equipe?
Aproximadamente 70. A unidade tem como principais responsabilidades realizar o planejamento financeiro, a gestão do portfólio, avaliar os riscos em diversos aspectos dos negócios em que a Companhia está envolvida, avaliar crédito dos clientes e executar a administração de seguros no Sistema Petrobras.

Terceiriza funções do departamento?
Não.

Quais são os principais desafios do gerente de risco com a volatilidade mundial causada com as incertezas sobre o crédito, o clima e o abastecimento de alimentos?
No caso de uma companhia do tamanho da Petrobras, acho que o maior desafio é estabelecer um fluxo de informações eficiente entre as áreas de negócio, que são efetivamente os gestores dos negócios e dos riscos associados, e a unidade corporativa de gestão de riscos. A atualização e precisão das informações são indispensáveis para que nossas ações produzam os resultados esperados. Também é crítico montar uma equipe bem capacitada e saber comunicar os resultados de análises tecnicamente complexas de forma simples e prática.

A alta administração sempre valorizou a unidade de riscos?
Sempre tivemos grande apoio da diretoria. A unidade foi criada por iniciativa do diretor financeiro da época. A alta administração já era sensível ao gerenciamento de riscos mesmo antes de obrigações legais (SEC e SOX) colocarem o tema em destaque.

Quando a área ganhou maior destaque dentro da petrolífera?
O assunto adquiriu maior relevância com o início do processo de desregulamentação dos preços domésticos, em 1996, e vem crescendo de importância por conta de obrigações legais e conscientização de que tende a ser um diferencial competitivo em empresas de grande porte.

Quais são os riscos mais temidos pelos acionistas?
Considerando os questionamentos que recebemos dos acionistas, os riscos mais temidos são os relacionados aos preços de petróleo e derivados, os que impactam a implementação de grandes projetos (atraso no início de operação de grandes plataformas de produção, por exemplo), e os riscos “regulatórios”, principalmente a preocupação de alterações nas regras de concessão pelos governos para se apropriar de parcela maior dos lucros dos empreendimentos em razão de preços de petróleo elevados ou descoberta de reservas gigantes.

Como avalia que tipo de proteção cada risco necessita?
O tratamento a ser utilizado a cada risco é conseqüência direta da aplicação das orientações da diretoria executiva quanto aos limites de exposição (tolerância ao risco) e os instrumentos admitidos. Essa estrutura de gestão de riscos deve permitir uma decisão imediata de resposta ao risco o mais próximo possível do próprio gestor do negócio que produz o risco. Caso ainda não existam regras formais aprovadas para um risco específico, o risco é discutido na unidade corporativa de riscos para uma análise da resposta mais adequada de maneira integrada com as demais exposições de risco da companhia.

Que tipo de proteções costuma usar para minimizar riscos patrimoniais e financeiros?
Basicamente, os riscos patrimoniais são tratados com seguros e para os riscos financeiros são priorizadas ações estruturais, aproveitando ao máximo o alinhamento de ativos e passivos para que se compensem e minimizem a exposição. Eventualmente, utilizamos derivativos para proteger certas exposições financeiras.

Em que situações o seguro é recomendado como mitigador de risco?
O sistema Petrobras tem por filosofia básica reter riscos em níveis prudentes e compatíveis com sua robustez financeira. O nível de retenção de riscos aceitável, a partir do qual o risco deve ser transferido ao mercado, através da compra de uma cobertura securitária, é determinado por sua diretoria executiva, anualmente, quando da apreciação do Plano Anual de Seguros (PAS).

O que vem a ser o PAS?
O PAS identifica as linhas mestras da política de gerenciamento de risco adotada para garantir e proteger os bens e direitos da Companhia, através de seguros, nele estão especificados os seguros a serem contratados, os limites e franquias.

Quais riscos a Petrobras transfere para seguro?
Os riscos que na eventualidade de sua ocorrência provoquem um impacto financeiro significativo nas suas atividades; que são uma obrigação legal ou uma exigência contratual; ou tem um custo de transferência para seguro inferior à perda esperada. Nos demais casos, a diretoria opta por praticar o auto-seguro. Ainda que a ocorrência de algum evento possa vir a provocar um impacto financeiro, significativo, a prática de auto-seguro poderá ser considerada, também, nos casos em que o seguro tenha uma elevada relação custo / benefício, isto é, quando o custo do seguro for considerado como elevado em relação à proteção proporcionada, dada a probabilidade de ocorrência de sinistro.

Quais as análises de risco que mais demandam a atenção do departamento?
A análise de risco de mercado (commodities e câmbio, principalmente) e seus efeitos no fluxo de caixa da companhia, assim como a análise dos grandes projetos de investimento porque eles requerem conhecimento detalhado das características dos empreendimentos para a modelagem adequada das variáveis que influenciam o retorno em cada caso.

A empresa tem o hábito de consultar o departamento de risco antes de decidir por um novo investimento?
Sim. Na realidade, é procedimento regular submeter para análise de riscos todo investimento que vai ser decidido na Diretoria Executiva, ou seja, qualquer projeto com investimento acima de US$ 25 milhões. Entretanto, é cada vez mais comum os gestores dos projetos nos procurarem para avaliar também os projetos de investimento abaixo deste valor, que são aprovados na própria área de negócio executora.

Que tipo de levantamento é feito?
Em geral, os fatores considerados na análise dos projetos de investimento são as incertezas do valor do investimento, custos operacionais, cronograma de entrada em operação, produção/demanda e preços de insumos e produtos. Eventualmente, outros fatores podem ser considerados, se forem relevantes em projetos específicos, tais como taxa de câmbio, risco de crédito, risco regulatório, etc.

O que mudou no gerenciamento de risco após o acidente com o afundamento da plataforma em 2001?
Imediatamente após o acidente a Petrobras iniciou um conjunto de ações que vieram a constituir o programa denominado PEO – Programa de Excelência Operacional das Unidades Marítimas, cujo objetivo é, além de atuar nas causas prováveis do acidente, permitir que a Petrobras alcance a excelência nas operações marítimas de Exploração & Produção. O PEO possui requisitos que vão além da legislação e das normas ora vigentes, abrangendo as áreas de engenharia de projetos, segurança, estabilidade e lastro, manutenção, operação e recursos humanos.

Quais foram as principais ações tomadas?
Se destacam a revisão das Diretrizes de Projeto de Unidades; revisão da organização do trabalho das Unidades Marítimas de Produção; divulgação interna e externa de todas as causas e ações subseqüentes ao acidente da P-36, tendo como objetivo contribuir para o aprimoramento das práticas internacionais da Indústria de Petróleo; e o aperfeiçoamento dos profissionais de controle de estabilidade e lastro.

Foi difícil receber a indenização?
O dano material foi prontamente indenizado, pela apólice de riscos de petróleo, menos de quatro meses depois do acidente e a responsabilidade civil do Sistema foi coberto, neste caso, pela proteção de P&I que a plataforma tinha e pagou as indenizações. O acidente ressaltou a importância de se ter seguradores e resseguradores sólidos e um broker preparado para oferecer todo o suporte necessário no momento do sinistro.

A Petrobras tem muitas operações internacionais. Como avalia e controla o risco das operações fora do Brasil?
Basicamente, através do custo de capital aplicado para a avaliação dos investimentos. A Petrobras define um custo de capital específico para cada segmento de negócio e para cada país de atuação, levando em conta os riscos do negócio. Esses valores são reavaliados periodicamente pela Diretoria Executiva.

Como tem lidado com os riscos ambientais?
Dentro das práticas industriais mais modernas, a Petrobras criou, em 2000, uma área corporativa de Segurança, Meio Ambiente e Saúde (SMS) com a missão de integrar a saúde ocupacional à segurança e ao meio ambiente, implementar o programa Pégaso, um dos maiores do gênero da indústria mundial de petróleo, e preparar a empresa para os desafios do crescimento.

Qual o objetivo do Pegaso?
Com os investimentos do Pégaso – que, por extenso, significa Programa de Excelência em Gestão Ambiental e Segurança Ocupacional –, a Petrobras deu um salto rumo à excelência nas questões de segurança operacional, meio ambiente e saúde. Foram revisados e modernizados os equipamentos, processos e instalações da companhia, reforçados os planos de contingência e aprimorados os sistemas de gestão de acordo com os mais modernos padrões internacionais.

Essa filosofia abrange todas as operações?
Todas as unidades da Petrobras, no Brasil e no exterior, têm sua estrutura própria de SMS, e a integração de toda essa rede é assegurada por um sistema de governança composto de comitê e subcomitês, com representantes de todas as áreas de negócio, serviços e subsidiárias da companhia. A aplicação desse modelo de gestão tem garantido à Petrobras melhora constante em todos os seus indicadores de SMS.

A mudança climática preocupa o grupo?
Sim, consciente da importância de seu papel com relação à questão da mudança climática, a Petrobras resolveu incluí-la em seu Plano Estratégico 2020 criando um projeto estratégico específico para a área e estabelecendo metas. Em seu Plano Estratégico 2020, a Petrobras expressa claramente sua determinação de minimizar a exposição da companhia aos riscos associados à mudança climática; a reduzir a intensidade de emissão de gases de efeito estufa, tanto nos seus processos quanto na oferta de produtos, e a tornar mais visíveis para a sociedade as ações e resultados obtidos nesta área.

Quais os investimentos feitos nos últimos anos para melhorar a segurança da Petrobras?
A Petrobras está empenhada em atingir padrões de segurança que a coloquem no mesmo patamar das melhores empresas do mundo do setor de óleo e gás. Para isso estabeleceu em seu Plano Estratégico uma meta de Taxa de Freqüência de Acidentados com Afastamento (TFCA) de 0,5 para 2010, incluindo empregados próprios e contratados, o que representa um nível de excelência internacional.

O plano tem atingido os objetivos traçados?
A meta ambiciosa do Plano Estratégico levou a empresa a adotar normas de segurança que ultrapassam as exigências da legislação. Para garantir o alcance desses padrões está em curso o Programa de Segurança do Processo (PSP), que visa implementar, em todas as unidades da companhia, a Política e as Diretrizes Corporativas de segurança, meio ambiente e saúde (SMS). Para conseguir esses objetivos, a Petrobras investe maciçamente em treinamento e equipamentos para reduzir acidentes e melhorar a eficiência de reparação das conseqüências.

O que a Petrobras faz para reduzir a emissão CO2?
A Petrobras investe no aumento da eficiência energética, em redução do gás flaring, em biocombustíveis, em energias alternativas (solar, eólica, térmica, etc.) no desenvolvimento tecnológico de processos e produtos que contribuam para a redução de emissão de gases do efeito estufa e estimula o uso eficiente de combustíveis. Em 2001, por exemplo, a Petrobras lançou o Plano de Otimização do Aproveitamento de Gás (POAG) em 24 plataformas da Bacia de Campos. E graças, entre outras medidas, à instalação e o redimensionamento de compressores e à construção de novos gasodutos marítimos, a companhia conseguiu uma redução significativa na queima de gás natural e, conseqüentemente, nas emissões de CO2 na atmosfera. Outro exemplo é o Programa Interno de Conservação de Energia contribuiu para que a companhia atingisse, em 2006, uma redução de 180 mil toneladas na emissão de gás carbônico equivalente.

Acredita que a abertura do resseguro no Brasil vai exigir mais do gerente de risco? Por quê?
A abertura do mercado de resseguro certamente irá trazer novos desafios ao gerente de riscos. Até o advento da lei, com exceção de preocupação quanto à solvência da seguradora, o risco relativo ao resseguro era virtualmente inexistente, pois o IRB garantia o pagamento do resseguro, ainda que eventuais retrocessionários não viessem a honrar o pagamento. No caso de empresas grandes, como a Petrobras, como o resseguro respondia, por vezes, por mais de 90% do prêmio final, pois a capacidade de retenção das seguradoras era mínima, face ao tamanho do risco, o risco associado com a seguradora era pequeno. A partir de agora, inexiste esta obrigação, e assim, além da preocupação com a solvência da seguradora, que passa a responder pelo pagamento caso não obtenha o pagamento do resseguro, passa a ter de se preocupar, também, com a qualidade do resseguro.

E terão de ter mais informações, não?
O trabalho de levantamento de informações para efeito de seguro aumenta. O nível de exigência de informações dos resseguradores deverá ser maior e demandará maior detalhes. As regulações de sinistros devem ser mais rigorosas e demorar mais, pois os resseguradores internacionais serão, por certo, muito mais rigorosos e exigentes com relação à qualidade das informações que terão de ser fornecidas na regulação.

Acha importante o profissional estar em sincronia com o que acontece no mundo?
Como as inovações do mercado internacional devem começar a serem rapidamente repassadas para o mercado nacional, o gerente de risco terá de se manter, permanentemente, informado dessas inovações para adotá-las no seu plano de gerenciamento de riscos.

As ações da Petrobras estão entre as mais negociadas da Bovespa. Isso aumenta o trabalho do gerente de risco?
O trabalho seria o mesmo se a Petrobras fosse uma companhia de capital fechado. O que aumenta é a responsabilidade de comunicar com clareza e precisão as exposições da companhia por causa do impacto que as informações têm nas decisões dos investidores.

Que conselho daria aos gerentes de risco que, com a abertura do resseguro, terão mais responsabilidades e opções?
Que passem a atuar com maior antecedência no caso das contratações e renovações de seguro e que se preocupem mais com o volume e a qualidade das informações a serem prestadas para as contratações. Além disso, monitorar, permanentemente, a evolução dos níveis de solvência das seguradoras e a qualidade dos resseguradores. Finalmente, acompanhar a evolução do mercado internacional para antecipar os ciclos de mercado e adotar, com maior rapidez, as inovações que possam se traduzir em eficiência na cobertura dos riscos que se deseja mitigar.

Como lida com riscos difíceis de serem segurados, como de reputação, por exemplo?
Administramos esse tipo de risco atuando eficientemente sobre os riscos precursores e nos mantendo preparados para responder com rapidez às conseqüências de eventos nocivos. Dano na reputação é resultado da perda de confiança dos públicos de interesse em reação a eventos que devem ser gerenciados diretamente, tais como qualidade de produtos e serviços, prevenção de acidentes, danos ambientais e fraudes, preocupação com as comunidades afetadas, etc., ou enfrentados prontamente para limitar suas conseqüências.

Que tipo de política tem para dar um conforto maior ao acionista?
A comunicação franca de nossas práticas de gestão.

Acredita que uma boa política de gestão de risco influencia na avaliação dos acionistas?
Certamente. Acredito que a gestão de risco é um componente da gestão dos negócios que tende a se tornar cada vez mais importante como diferencial competitivo entre grandes companhias.

Matéria veiculada na revista Gerencia de Riscos e Seguros, do grupo Mapfre

Denise Bueno
Denise Buenohttp://www.sonhoseguro.com.br/
Denise Bueno sempre atuou na área de jornalismo econômico. Desde agosto de 2008 atua como jornalista freelancer, escrevendo matérias sobre finanças para cadernos especiais produzidos pelo jornal Valor Econômico, bem como para revistas como Época, Veja, Você S/A, Valor Financeiro, Valor 1000, Fiesp, ACSP, Revista de Seguros (CNSeg) entre outras publicações. É colunista do InfoMoney e do SindSeg-SP. Foi articulista da Revista Apólice. Escreveu artigos diariamente sobre seguros, resseguros, previdência e capitalização entre 1992 até agosto de 2008 para o jornal econômico Gazeta Mercantil. Recebeu, por 12 vezes, o prêmio de melhor jornalista de seguro em concursos diversos do setor e da grande mídia.

DEIXE UMA RESPOSTA

Por favor digite seu comentário!
Por favor, digite seu nome aqui

Ouça nosso podcast

ARTIGOS RELACIONADOS