As grandes empresas do Brasil serão beneficiadas por um programa de seguros mais amplo e com um custo mais acessível. Essa é a aposta da grande maioria dos executivos de seguradoras e corretoras. A avaliação tem como base a abertura do mercado de resseguros no País e o ciclo de farta oferta de capacidade no mercado internacional. “Em função principalmente de ausências de grandes catástrofes naturais nos dois últimos anos, o mercado internacional está em um ciclo de baixa de preços”, lembra Carlos Almeida, vice-presidente de Riscos Industriais e Comerciais da SulAmérica. Situações favoráveis à queda de preço.
A abertura do resseguro traz, de imediato, benefícios para as maiores empresas do Brasil. Isso porque são elas que demandam quase a totalidade dos R$ 3,5 bilhões em resseguro que é contratado no País. “O principal impacto deve ser nos grandes negócios, especialmente property e riscos de engenharia, aonde a disputa por clientes é constante. Com base nesse cenário, esperamos uma competição mais acirrada entre as empresas, resultando em conseqüente redução de preços. Novos produtos e maior agilidade no mercado também devem ser conseqüências da abertura do resseguro no País”, acredita Felipe Smith, diretor técnico da área corporate da Tokio Marine.
Porém este cenário é traçado para clientes com bom histórico de acidentes. Algumas empresas poderão encontrar dificuldades de renovar o seguro, como as que têm um grande índice de acidentes e um histórico de perdas razoável. A parceria entre cliente, corretor, seguradora e ressegurador será fundamental daqui para frente, uma vez que o mercado de resseguros está aberto e as empresas não podem contar mais com a cobertura quase obrigatória que o IRB Brasil Re, que deteve o monopólio por quase 70 anos, dava por ser monopolista.
O IRB já disse não para alguns segurados, que levaram um susto e tanto. A siderúrgica CSN foi um deles. Apesar de seu tamanho, o grupo enfrenta dificuldades para obter o valor de cobertura de seguro necessária a um preço razoável por atuar em um nicho de restrita oferta de cobertura, com poucos operadores e ainda ter um histórico de grandes perdas e troca de parceiros a todo ano.
A abertura traz automaticidade para as empresas. As seguradoras já desenharam contratos automáticos com seus parceiros de resseguro. Isso dará agilidade e melhores condições nos contratos. Para Jacques Bergman, diretor da Itaú XL, os programas com importância segurada entre R$ 100 milhões e R$ 300 milhões é que serão os mais afetados. “Valores abaixo dos R$ 100 milhões já eram atendidos pelas seguradoras dentro de suas capacidades de retenção. Os acima de R$ 300 milhões eram tratados como facultativos, diretamente com o mercado internacional”, diz.
A competição e mudanças estarão nos contratos entre R$ 100 milhões e R$ 300 milhões. “Esses terão uma modificação grande em termos de preços e serviços”, aposta Bergmann. A projeção é de que 70% dos riscos que eram colocados de forma facultativa, acima dos limites determinados pelo IRB, sejam agora colocados dentro dos contratos automáticos negociados pelas seguradoras. Ficando apenas 30% como facultativo. Essa mudança poderá reduzir o prazo de cotação dos contratos de em alguns casos chegavam a até três meses para três a cinco dias.
Em segmentos que o IRB não operava, como seguro multirisco de até R$ 100 milhões de importância segurada, transporte nacional rodoviário, aeronaves de pequeno porte, produtos financeiros e de responsabilidade civil, por já haver uma livre concorrência de preço, pouca mudança deverá ocorrer.
O gerente de risco terá um papel fundamental a partir de agora. Quanto mais informações armazenadas, mais correto será o cálculo do preço do seguro. Quanto maior o investimento em segurança, melhor as condições do contrato de seguro. Em contrapartida, as empresas seguradas terão a sua disposição um farto leque de produtos, coberturas e preços.
As seguradoras e corretoras terão um grande desafio. Com a possibilidade de cotação através de diversos brokers ou diretamente através de resseguradores, os preços podem ser os mais diversos. “Dependendo de que mercado seja contatado nas negociações, as ofertas de preço podem mudar e ocorrer casos de reduções de preços”, explica Luiz Carlos Nabuco, diretor gerente comercial da Bradesco Auto/RE Corporativo.
Apesar da tentação de ter um preço melhor, todo cuidado será pouco. “O risco do IRB era nulo por ter o Tesouro como controlador. Agora será preciso avaliar a solvência das empresas envolvidas no contrato”, diz Pedro Purm, presidente da Zurich Seguros. “Será muito importante os clientes/segurados estarem atentos exatamente para quem estará dando suporte nestas condições. O risco de crédito passa a ser uma realidade que antes ficava garantida pelo único ressegurador em atividade no mercado”, reforça Nabuco.
Outro ponto importante é a volatilidade. Se por um lado o monopólio de resseguros gerava um preço, em geral, igual para todos e acima da média do mercado internacional, por outro os clientes estavam protegidos de flutuações acentuadas. “Com a desregulamentação o mercado fica alinhado com os preços dos mercados internacionais, podendo assim ter variações positivas ou negativas de maneira a refletir mais imediatamente as flutuações do mercado internacional de resseguro”, diz o executivo da SulAmérica.
A qualidade dos serviços deverá melhorar. Bergmann acredita que a abertura do resseguro fará com que as seguradoras busquem diferenciação por qualidade de serviço. “Isso será visto pelo cliente como um diferenciador forte”, diz.
A regulação de sinistros entra neste quesito. Antes o IRB era responsável por decidir sobre o levantamento das perdas em um acidente. Agora, o segurado terá a responsabilidade de escolha da empresa que prestará este serviço. Ela é a responsável por determinar o valor a ser pago, a velocidade que o sinistro será finalizado e também será a prestadora que cobrará a conta dos resseguradores”, diz Bergmann, que também presidente da comissão de riscos especiais e de resseguro da Fenseg.
Apesar da projeção de queda do preço do seguro, a expectativa é de um aumento significativo no volume de prêmios na carteira de riscos patrimoniais. Com produtos limitados e preços elevados, uma situação típica de um mercado monopolista, a compra de seguros pelas multinacionais se limitava a contratação de um seguro básico de incêndio ou de roubo para mercadorias no Brasil. As apólices mais complexas eram contratadas em países onde o resseguro é aberto.
Tal comportamento fica evidente pelo medíocre desempenho do ramo empresarial, com faturamento que não chega a representar 10% das vendas totais de seguro no Brasil. Em 2007, esse segmento movimentou prêmios de R$ 3,3 bilhões, decréscimo de 12%. A expectativa agora é de as multinacionais passem a ter um programa de seguro mais completo no País, além de novos produtos que estimulem mais empresas a protegerem seus patrimônios.
Afinal, o que seria das ações da Petrobras em 2001 se não tivesse o seguro de US$ 500 milhões para recuperar a perda da P-36? E da CNS, que já recebeu aproximadamente US$ 400 milhões pelo acidente com o alto forno em janeiro de 2006? Sem falar nos acidentes das empresas aéreas Tam e Gol, tendo algo próximo de US$ 40 milhões cada uma só considerando-se a aeronave, e o Consórcio Via Amarela que acionou a Unibanco AIG para indenizar e prestar um pronto atendimento às vítimas da cratera que se abriu nas obras de expansão da Linha Amarela do Metrô de São Paulo.
*Matéria da autora publicada na Gazeta Mercantil em abril de 2008