2008: realmente um ano novo para seguros*

O ano já começa com novidades para as seguradoras, empresas de previdência e capitalização, segmentos que projetam chegar em dezembro próximo com faturamento de R$ 96 bilhões. É previsto para hoje, primeiro dia útil de 2008, muita movimentação na Susep (Superintendência de Seguros Privados). “Tenho informações firmes de que teremos o registro de três resseguradores locais para o dia 2”, informa Armando Vergílio, da Susep, em entrevista a este jornal. Nas apostas entre os participantes, os nomes mais cotados para operar como local são Transatlantic Re, que tem o grupo americano AIG como principal acionista, e XL Capital, das Bermudas, sócia do Itaú no Brasil.

Tal movimentação só está prevista porque a Susep aceitou mudar parte das regras iniciais propostas nas minutas da audiência pública contendo as regras de abertura do resseguro, um setor que movimenta cerca de R$ 3,5 bilhões por ano e pode dobrar de tamanho em cinco anos. Cerca de 70% das sugestões apresentadas pelo mercado foram aceitas. “Creio que o mercado ficou quase 100% satisfeito. A nova diretoria e toda a equipe da Susep trabalhou muito nesse período porque sabemos que é um momento histórico para o mercado de seguros”, diz ex-corretor de seguros.

Em quase quatro meses que está no cargo, Vergílio teve um início agitado. Conseguiu aprovar as regras de abertura do resseguro agradando a quase todos, alterou o que os executivos chamavam de “distorções” nas regras de solvência, flexibilizando a exigência para a maioria das companhias, criou as cooperativas de corretores e ainda mandou para a Casa Civil um projeto de criação do fundo garantidor para o setor de seguros, previdência e capitalização. Veja a seguir trechos da entrevista.

Gazeta Mercantil – Seus 130 primeiros dias de governo foram bem corridos…

Armando Vergílio: Foram dias agitados, mas valeu a pena. Foi um marco histórico para o setor conseguir aprovar a abertura do resseguro e novas regras de solvência. Agora começamos o ano focados em novos planejamentos, como o seguro popular de carro, o microsseguro e produtos de previdência privada voltados para saúde e educação.

Gazeta Mercantil – Quais foram as medidas que mais exigiram o esforço da autarquia?

Armando Vergílio: A Susep tinha diante de si alguns grandes desafios que já estavam sendo conduzidos antes do início da nossa gestão. Entre eles, havia a implantação da Supervisão Baseada em Risco, tendo como parâmetro o modelo preconizado pela IAIS; o estabelecimento das Novas Regras de Capital e a regulamentação do resseguro, dentro das diretrizes da Lei Complementar 126. Esse último era, acima de tudo, um assunto novo ainda pouco conhecido pelo corpo técnico da autarquia, que precisou buscar informações sobre os modelos de resseguro existentes em diversos países, inclusive através da capacitação fora do País, a fim de adaptar as melhores práticas à realidade do mercado brasileiro. O que se buscou foi um equilíbrio entre dois extremos: a abertura desmedida e o protecionismo exagerado.

Gazeta Mercantil – Qual a projeção de crescimento do setor com essas mudanças?

Armando Vergílio: 2008 será o ano base de uma fase de crescimento sustentado que nos permitirá dobrar a participação do setor no PIB em, no máximo, quatro anos, de 3% para 6%. O seguro deverá crescer acima da média da economia nacional nos próximos anos. Contudo, o mercado precisa se preparar visando a oferecer confiança aos consumidores e investidores.

Gazeta Mercantil – O que fez a Susep mudar os principais pontos das normas de resseguro?

Armando Vergílio: No momento de elaboração das normas sabíamos que alguns pontos seriam polêmicos, por exemplo, a questão das reservas adicionais para os resseguradores admitidos e as regras de preferência de 60% na oferta para os resseguradores locais. Algumas dessas diretrizes não poderiam ser mudadas pela Susep simplesmente porque faziam parte da Lei Complementar 126, mas outras poderiam porque de fato agregaram valor às normas, como a redução da garantia de depósito de US$ 5 milhões para US$ 1 milhão para as resseguradoras de vida e a flexibilização das reservas adicionais para as empresas com rating elevado. Consideramos que apenas pontos específicos foram questionados, havendo inclusive coincidência de sugestões sobre algumas minutas.

Gazeta Mercantil – Sim, você se refere a três pontos que determinavam o sucesso ou o fracasso do projeto de abertura. Os estrangeiros agradecem a mudança com os investimentos que farão no Brasil. Qual a sua impressão sobre o resultado final das regras de resseguro?

Armando Vergílio: Consideramos que o resultado foi muito positivo. Acatamos cerca de 70% das sugestões enviadas durante a audiência pública. Tal como foram formuladas, as regras serão fundamentais para nos ajudar na formação de um mercado ressegurador local forte e competitivo e ao mesmo tempo receptivo às resseguradoras eventuais e admitidas dispostas a investir no Brasil e a crescer junto conosco.

Gazeta Mercantil – Há vida além do resseguro. Como ficam as mudanças nas regras de solvência?

Armando Vergílio: As regras de capital serão fundamentais para o fortalecimento do mercado segurador, na medida em que as empresas só assumirão seus riscos se estiverem preparadas para tal. Alguns ajustes serão necessários e cada uma está buscando as próprias estratégias para se adequar. No entanto, com a ampliação de três para quatro anos no prazo de enquadramento das seguradoras às novas regras de capital, que foram aprovadas pelo CNSP, as entidades terão mais tranqüilidade para fazer estes ajustes. Lembrando que os percentuais também foram modificados, passando a ser 15%, 25%, 30% e 30%.

Gazeta Mercantil – Também incluiu na reunião do CNSP as cooperativas de corretores. O que vem a ser?

Armando Vergílio: É uma medida que visa otimizar a área de operação do pequeno e médio corretor. O objetivo é reduzir sensivelmente o custo operacional e o tempo que o profissional gasta com a parte burocrática para que ele possa se dedicar mais ao aspecto comercial, que é o seu negócio, além de dar assistência com qualidade para seus segurados.

Gazeta Mercantil – Acredita que o governo estará aberto a negociar incentivos fiscais para os novos produtos de previdência?

Armando Vergílio: São produtos criados dentro dos moldes dos atuais PGBL e VGBL, onde o valor de retirada será repassado diretamente aos fornecedores, como escolas, no caso do educacional, e aos médicos, laboratórios e hospitais, no caso de saúde. Sentimos um clima positivo no governo para negociar a respeito de incentivos fiscais a estes produtos, responsáveis pelo crescimento de previdência complementar nos Estados Unidos. Esses produtos podem aliviar o serviço público de educação e de saúde ao ajudar as pessoas a criarem reservas de longo prazo para cuidarem destes dois problemas que preocupam a todos por serem essenciais e custosos. A Susep atuará com o intuito de convencer as autoridades governamentais de que é possível rever a carga tributária incidente sobre as receitas geradas nesse setor.

Gazeta Mercantil – Bem, 2007 já acabou. O que espera deste ano?

Armando Vergílio: 2008 chega com um cenário favorável ao crescimento do mercado e às grandes mudanças que estão por vir. Juros em queda, inflação anual de 4,5%, US$ 170 bilhões de reservas, balança comercial de 2007 fechando em alta de US$ 42 bilhões e taxa de desemprego diminuindo. O papel da Susep neste contexto é oferecer segurança para consumidores e segurados.

Gazeta Mercantil – Pelas mudanças, a Susep terá de mudar junto com o setor. Há investimentos previstos para poder fiscalizar o setor com tantas regras novas?

Armando Vergílio: A Susep manterá sua postura fiscalizadora, mas que pretende implantar uma fiscalização preventiva e orientadora. Quero uma fiscalização personalizada, por isso a Susep tem que interagir com o mercado. Neste tipo de fiscalização baseada em riscos e nos controles internos o foco não está exclusivamente na verificação do cumprimento das normas pelas empresas pertencentes aos mercados supervisionados, mas também na identificação dos diferentes tipos de riscos a que as mesmas estão submetidas (crédito, mercado, operacional, legal e de subscrição), e na forma de como é realizado o gerenciamento de tais riscos. Nos trabalhos de inspeção in loco e supervisão personalizada, dentro desse novo modelo de supervisão, o foco está voltado para a análise das situações de risco operacional, entendido como sendo aquele relacionado à incerteza quanto aos retornos de uma instituição no caso de falhas operacionais, o que depende diretamente da eficiência de seu sistema de controles internos, no sentido de minimizar a ocorrência de eventos como falhas humanas, danos à infra-estrutura de suporte, fraude interna e externa, interrupção de negócios e falhas em sistemas, entre outros.

Gazeta Mercantil – Também haverá uma mudança física, não?

Armando Vergílio: Sim, a Susep será deslocada do prédio atual para o edifício onde está o Banco Central, também no centro do Rio de Janeiro. As novas instalações serão equipadas e a autarquia fará concurso público para contratar mais 250 novos funcionários já em 2008.

Gazeta Mercantil – O que o setor pode esperar da Susep em 2008?

Armando Vergílio: Espero que a Susep possa ser reconhecida não apenas pelo papel repressivo e fiscalizador dos mercados de seguro, previdência complementar aberta, capitalização e resseguro, mas que todos – mercado, entidades supervisionadas, empresários e os consumidores – possam reconhecer esta autarquia como uma grande fomentadora do crescimento do mercado e do País.

Gazeta Mercantil – O que faz você ter o microsseguro como bandeira?

Armando Vergílio: No mundo todo o microsseguro é um grande instrumento de inclusão social e de proteção aos cidadãos de menor poder aquisitivo, já que muitas vezes o bem segurado o grande patrimônio da vida desse cidadão. Acho que é uma modalidade de seguro que daria muito certo no Brasil, diante do potencial público a ser segurado por este tipo de cobertura. No entanto, é importante frisar que microsseguro é diferente e seguro popular, daí a necessidade de adequar modelos internacionais à realidade do nosso País.

Gazeta Mercantil – Qual o potencial do microsseguros?

Armando Vergílio: Queremos trazer para o mercado 100 milhões de novos consumidores das classes C, D e E com a oferta de produtos que têm uma função relevante: a de permitir a inserção social e a proteção das vidas e do patrimônio da população de menor poder aquisitivo.

Gazeta Mercantil – Como pretende ajudar o setor a implementar o seguro popular de carro?

Armando Vergílio: Para viabilizar o seguro popular para carros com mais de dez anos de uso seriam necessárias medidas como a redução fiscal e, por exemplo, o uso de peças usadas certificadas.

Gazeta Mercantil – Um dos grandes temores é a demanda judicial que coberturas restritas podem gerar.

Armando Vergílio: A viabilização desse seguro também passa pela adoção de regras claras e simples. É importante que o mercado possa atuar com menos amarras. A nossa indústria amadureceu bastante e é natural que haja maior demanda por menor interferência dos órgãos reguladores. É necessário que tenhamos regras claras e modernas. Isso trará a necessária segurança jurídica e regulatória.

Gazeta Mercantil – E capitalização, haverá tempo para fazer a regulamentação deste segmento?

Armando Vergílio: Já iniciamos a regulamentação relativa à capitalização com a aprovação do CNSP do corretor exclusivo para venda de títulos de capitalização.

Gazeta Mercantil – Que cenário prevê para o setor de seguros até o final do governo Lula, em 2010?

Armando Vergílio: Espero que consigamos atingir a meta de crescimento do setor de seguros para 6% ou 7% do PIB nacional. É preciso saber ser otimista sem deixar de lado a recomendável cautela e sem cair na tentação da euforia. Ainda há muito a avançar em questões tais como a reforma tributária e a redução das taxas de juros, por exemplo. São gargalos que certamente serão removidos no momento adequado. A equipe econômica comandada pelo ministro Guido Mantega e o Banco Central têm trabalhado firme para assegurar uma transição tranqüila, sem solavancos.

*Matéria da autora publicada na Gazeta Mercantil em 02/01/2008

Denise Bueno
Denise Buenohttp://www.sonhoseguro.com.br/
Denise Bueno sempre atuou na área de jornalismo econômico. Desde agosto de 2008 atua como jornalista freelancer, escrevendo matérias sobre finanças para cadernos especiais produzidos pelo jornal Valor Econômico, bem como para revistas como Época, Veja, Você S/A, Valor Financeiro, Valor 1000, Fiesp, ACSP, Revista de Seguros (CNSeg) entre outras publicações. É colunista do InfoMoney e do SindSeg-SP. Foi articulista da Revista Apólice. Escreveu artigos diariamente sobre seguros, resseguros, previdência e capitalização entre 1992 até agosto de 2008 para o jornal econômico Gazeta Mercantil. Recebeu, por 12 vezes, o prêmio de melhor jornalista de seguro em concursos diversos do setor e da grande mídia.

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